
BEATA MARIA DOS APÓSTOLOS
Maria Teresa von Wüllenweber nasceu na
Alemanha, no Castelo de Myllendonk, perto de Mönchengladbach, no dia 19 de
Fevereiro de 1833. Era a mais velha das cinco filhas do Barão Teodoro von
Wüllenweber. Teresa cresceu num ambiente profundamente religioso, austero em
alguns aspectos, mas caracterizado por fortes laços familiares. O seu pai, um
homem íntegro e afável, era muito querido por todos. Teresa recebeu a sua
educação inicial em casa, sob o cuidado da mãe e de vários padres. Aos quinze
anos, foi estudar e completar a sua formação, na Escola das Irmãs Beneditinas,
de Liège, onde, considerando Roma o coração do cristianismo, também optou por
estudar italiano.
Ao voltar para sua família, durante vários
anos, ajudou o seu pai a administrar a propriedade familiar, enquanto
desenvolvia o desejo de se dedicar ao Senhor. Escrevendo um poema,
confidenciou: "O coração é uma coisa verdadeiramente tempestuosa;
raramente encontra um momento de serenidade".
Em 1853 e 1857, ela e a sua mãe
participaram em retiros jesuítas - uma prática, na época, exclusiva para homens
– durante os quais nasceu o seu grande amor pelas missões. Um dia, escreveu:
"Tudo o que não leva a Deus é engano… Gostei, especialmente, de estudar as
passagens do Evangelho que nos contam como, no tempo de Jesus, os apóstolos e
as mulheres piedosas trabalharam juntos, por Cristo".
Aos vinte e quatro anos, contra a vontade
do seu pai, mas com a permissão da mãe - que morreu repentinamente, pouco
depois - entrou para o Convento do Sagrado Coração, em Blumenthal, perto de
Aachen. Ocupou vários cargos em Warendolf e Orléans, França, mas embora
estivesse feliz com o seu apostolado e próxima da sua profissão solene, sentia
no seu coração que o Senhor tinha outros planos para ela. Então, deixou o
Instituto, amigavelmente, em Março de 1863. Na carta de demissão, a fundadora -
Santa Madalena Sofia Barat - escreveu: "…piedosa e bondosa... não se
constatou que tivesse vocação para ser educadora". Foi uma experiência
muito importante. Ao longo da sua vida, foi sempre uma grande devota do Sagrado
Coração.
No dia em que deixou o Convento, ela e o seu
pai foram ao Convento das Irmãs da Visitação - que também se dedicavam à
educação das raparigas - mas essa experiência também foi breve, para constrangimento
da sua família. Durante algum tempo, cuidou da casa e das irmãs, até que, em
1868, entrou na Congregação da Adoração Perpétua, em Bruxelas, com atribuições
também em Liège.
Ela viu, com os seus próprios olhos, o
quanto era necessário o apostolado entre os pobres. Ela escreveu:
"Milhares de alemães pobres emigram para Liège porque, como não há
escolaridade obrigatória para as crianças, elas são enviadas para trabalhar nas
minas de carvão. Assim, tornam-se vítimas da corrupção, sem religião,
arruinadas espiritual e fisicamente." Na altura, falou-se da criação de
uma fundação na Alemanha, mas o projecto nunca se concretizou. Eram os anos da
Kulturkampf, [significa, em alemão, ‘luta cultural’: foi a tentativa, por parte
do chanceler alemão, Otto von Bismarck - protestante convicto - para submeter a
Igreja Católica Romana ao controlo do Estado. O termo entrou em uso em 1873,
quando o cientista e estadista liberal prussiano Rudolf Virchow declarou que a
batalha contra os católicos romanos estava a assumir o carácter de uma grande
luta em favor da humanidade] caracterizada por perseguições anticlericais; pela
expulsão dos Bispos e dos padres; destruição das estruturas diocesanas e pelo
encerramento dos seminários.*
Dois anos depois do início deste conflito,
Maria Teresa voltou para casa.
Em 1872, Teresa conheceu o pároco de
Neuwerk, que se tornou seu director espiritual. Ela ia a pé, todos os dias,
para visitá-lo, fizesse chuva ou fizesse sol. Começaram a falar sobre uma nova
fundação. Entre os seus escritos, lemos: “Quero entregar-me inteiramente a Ti,
totalmente, para o que quer que queiras. Quero desaparecer em completa
humildade como Teu pobre instrumento.” “Ó Senhor! Deves ter lançado uma faísca
de amor no meu coração; e quando penso nos descrentes, sinto uma profunda
tristeza.”
Em 1876, ela alugou (e mais tarde comprou)
parte do antigo mosteiro beneditino de Neuwerk e abriu, ali, o Instituto Santa
Bárbara para cuidar de órfãos, meninas e mulheres solteiras. Diante das
dificuldades da época, tentou, sem sucesso, fundir-se com um instituto
semelhante. Entre outros, conheceu Santo Arnaldo Janssen [sacerdote
católico alemão, fundador da Sociedade do Verbo Divino (SVD), uma ordem religiosa
missionária que está presente em todos os continentes. Foi canonizado pelo papa
João Paulo II, no dia 5 de Outubro de 2003].
O ponto de virada aconteceu depois de ler,
num jornal, um anúncio do Instituto do Ensino Apostólico. No dia 4 de Julho de
1882, ela conheceu o jovem padre João Baptista Jordan (mais tarde, adoptou o
nome Francisco Maria da Cruz Jordan), que tinha fundado este Instituto, em Roma, seis anos antes (o
termo Apostólico foi, posteriormente, substituído por Católico). A diferença de
idade entre os dois era de quinze anos, e as suas origens sociais também eram
diferentes (o Padre Jordan era de origem humilde), mas os seus corações,
imediatamente, começaram a bater como um só. No seu diário, Teresa escreveu:
“Dificilmente poderia ter sentido uma alegria maior! Ele impressionou-me pelo
seu grande zelo apostólico. O meu único e sincero desejo é pertencer, cada vez
mais firmemente, a este Instituto, até à morte. Bom Deus, a Ti eterna
gratidão.”
O Padre Jordan nasceu numa pequena aldeia,
na Floresta Negra, e, desde jovem, teve de sustentar a sua família, devido à doença
do seu pai. Trabalhou como pintor antes de frequentar o ensino médio e,
finalmente, poder entrar no Seminário, em Freiburg. Ordenado sacerdote, em
1878, foi para Roma com o desejo de fundar uma obra apostólica para a renovação
católica, composta por homens e mulheres, consagrados e leigos, de todas as
classes sociais. Num mundo cada vez mais secularizado, todo o cristão precisava
de sentir-se um apóstolo. A disseminação de uma boa imprensa era
particularmente importante. O Padre Jordan foi beatificado, no dia 15 de Maio
de 2021, pelo Papa Francisco, na Basílica de São João de Latrão.
Dois meses após o primeiro encontro,
Teresa (que tinha quarenta e nove anos) entrou neste Instituto com votos
privados, dedicando-lhe "o seu convento". Em Roma, a Madre Streitel
era a Superiora das Irmãs do Instituto. Em Julho de 1884, Teresa esteve, por
pouco tempo, em Roma, durante um período de conflito entre o Padre Jordan e a
Madre Streitel. A Madre Streitel, desejando imprimir uma marca franciscana ao
seu trabalho, separou-se do Instituto, fundando as ‘Irmãs de Nossa Senhora das
Dores’.
Teresa, entretanto, voltou a Neuwerk e
passou vários anos em incerteza, até Novembro de 1888, quando, com um pequeno
grupo de outras freiras, foi chamada pelo Padre Jordan a Tivoli, em Itália.
No dia 8 de Dezembro de 1888, foi fundado
o novo ramo feminino do Instituto do Ensino Católico; Teresa foi eleita
Superiora, adoptando o nome ‘Irmã Maria dos Apóstolos’.
A nova Congregação rapidamente tornou-se
popular, com vocações vindas da Alemanha, da Suíça, da Áustria, da Hungria e
Tirol do Sul. Desde o início, o espírito foi internacional e missionário, tanto
que, após alguns anos, a Madre Maria enviou as primeiras freiras para a Índia e
para o Equador, acompanhando-as sempre com grande dedicação, por meio de
correspondência. Em Tivoli, em 1894, foi inaugurado um Seminário para a formação
de professoras, visando o aprimoramento das freiras, sob o olhar atento do
Padre Jordan. Pouco depois, uma epidemia de tifo eclodiu e algumas freiras
foram alojadas em Roma, enquanto chegavam da Alemanha as tristes notícias da
morte do pai de Teresa. À medida que a Obra recebia o seu nome definitivo,
Congregação do Divino Salvador, concretizou-se o desejo de transferir a
casa-mãe para mais perto da Basílica de São Pedro. Tivoli permaneceria como a sede
do noviciado por muitos anos, onde, em diversas ocasiões, a Madre Maria
demonstrou carinho maternal pelas noviças (chegando a brincar de cabra-cega com
elas).
A obediência ao Fundador foi sempre um
dever para a Irmã Maria dos Apóstolos. Quando surgiam desentendimentos e
descontentamentos, em Tivoli, eram superados com amor e humildade. Entretanto, foram
abertas novas casas: nos Estados Unidos, Suíça, Hungria, Áustria e Bélgica. No
final de 1905, foi realizado o Primeiro Capítulo, da Ordem, com a Madre, já
doente e idosa, quase cega. No entanto, ela foi reeleita. Infelizmente a sua
saúde, suportada com paciência religiosa, piorou progressivamente, com crises
de asma e problemas de mobilidade.
Dois anos depois, a meningite provou-se fatal:
a Irmã Morte surpreendeu-a, justamente, quando as suas Irmãs estavam na igreja,
para a Missa da Noite de Natal.
No dia 4 de Agosto de 1903, ela tinha
escrito o seu testamento espiritual: “Humildemente espero que as minhas boas
Irmãs rezem muito por mim. Que continuem a trabalhar com santo zelo pela sua
própria perfeição, sempre buscando fazer o verdadeiro bem aos outros,
mantendo-se firmes no Espírito do Fundador.”
A Madre Maria dos Apóstolos (Maria Teresa
von Wüllenweber) foi beatificada, no dia 13 de Outubro de 1968, pelo Papa Paulo
VI.
A sua memória litúrgica é celebrada no 5 de
Setembro.
*
Para ler mais, se tiver interesse
O conflito da Kulturkampf começou em Julho
de 1871, quando Bismarck, apoiado pelos liberais, aboliu o Gabinete Católico Romano,
no Ministério prussiano da Cultura ( ou seja, ministério
da educação e dos assuntos eclesiásticos) e em Novembro proibiu os padres
de expressar opiniões políticas, no púlpito. Em Março de 1872, todas as escolas
religiosas foram submetidas à inspecção do Estado; em Junho, todos os
professores religiosos foram excluídos das escolas públicas e a Companhia de
Jesus (dos jesuítas) foi dissolvida, na Alemanha; em Dezembro as relações
diplomáticas com o Vaticano foram rompidas. Em 1873, as Leis de Maio, promulgadas pelo
ministro da cultura prussiano, Adalbert Falk, colocava o ensino religioso sob o
controlo exclusivo do Estado, até mesmo as nomeações eclesiásticas, dentro da Igreja.
O clímax da luta veio em 1875, quando o casamento civil foi tornado obrigatório
em toda a Alemanha . As dioceses que não cumpriam os regulamentos do
Estado foram excluídas dos auxílios estatais e o clero desobediente foi exilado
Os católicos romanos, no entanto,
resistiram fortemente às medidas de Bismarck e opuseram-se a ele, efectivamente,
no Parlamento alemão, onde duplicaram a sua representação, nas eleições de
1874. Bismarck, um pragmático, decidiu recuar. Reconheceu que muitas das
medidas foram excessivas e serviram apenas para fortalecer a resistência do
Partido de Centro, de cujo apoio ele precisava para o seu novo impulso contra
os social-democratas. O advento de um novo Papa, em 1878, facilitou o
compromisso. Em 1887, quando Leão XIII declarou encerrado o conflito, a maior
parte da legislação anticatólica tinha sido revogada ou reduzida na sua severidade.
A luta teve como consequência assegurar o controlo do Estado sobre a educação e
os registros públicos, mas também afastou uma geração de católicos romanos da
vida nacional alemã.