PALAVRA COM SENTIDO

PALAVRA COM SENTIDO “… Recebei o Espírito Santos …" (cf. João 20, 22) “…Celebramos, hoje, a grande festa de Pentecostes, na qual a liturgia nos faz reviver o nascimento da Igreja, segundo quanto narra São Lucas, no livro dos Actos dos Apóstolos (2, 1-13). Cinquenta dias depois da Páscoa, o Espírito Santo desceu sobre a comunidade dos discípulos "assíduos e concordes na oração" reunidos "com Maria, a mãe de Jesus" e com os onze Apóstolos. Portanto, podemos dizer que a Igreja teve o seu solene início com a descida do Espírito Santo. Neste extraordinário acontecimento, encontra-mos as notas fundamentais e qualificadoras da Igreja: a Igreja é una, como a comunidade do Pentecostes, que estava unida na oração e "concorde": "tinha um só coração e uma só alma" (Act 4, 32). A Igreja é santa, não pelos seus méritos, mas porque, animada pelo Espírito Santo, mantém o olhar fixo em Cristo, para se tornar conforme com Ele e com o Seu amor. A Igreja é católica, porque o Evangelho se destina a todos os povos e, por isso, já desde o início, o Espírito Santo faz com que ela fale todas as línguas. A Igreja é apostólica porque, edificada sobre o fundamento dos Apóstolos, conserva fielmente o seu ensinamento, através da cadeia ininterrupta da sucessão episcopal. Além disso, a Igreja é, por sua natureza, missionária, e a partir do dia de Pentecostes o Espírito Santo não cessa de a estimular pelos caminhos do mundo, até aos extremos confins da terra e até ao fim dos tempos. Esta realidade, que podemos verificar em todas as épocas, já está antecipada no Livro dos Actos, onde se descreve a passagem do Evangelho dos Hebreus para os pagãos, de Jerusalém para Roma. Roma está a indicar o mundo dos pagãos, e assim todos os povos que estão fora do antigo povo de Deus. De facto, os Actos concluem-se com a chegada do Evangelho a Roma. Então, podemos dizer que Roma é o nome concreto da catolicidade e da missionariedade, expressa a fidelidade às origens, à Igreja de todos os tempos, a uma Igreja que fala todas as línguas e vai ao encontro de todas as culturas. Queridos irmãos e irmãs: o primeiro Pentecostes aconteceu quando Maria Santíssima estava presente, no meio dos discípulos, no Cenáculo de Jerusalém, e rezava. Também hoje, confiamo-nos à sua materna intercessão, para que o Espírito Santo desça, abundantemente, sobre a Igreja do nosso tempo; encha os corações de todos os fiéis e acenda neles o fogo do Seu amor…” (Papa Bento XVI, no dia 27 de Maio de 2007)

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

SANTOS POPULARES



SANTA CLARA DE ASSIS
(Catequese do Papa Bento XVI)

Uma das Santas mais amadas é, sem dúvida, Santa Clara de Assis, que viveu no século XIII, contemporânea de São Francisco. O seu testemunho mostra-nos o quanto a Igreja é devedora a mulheres corajosas e cheias de fé como ela, capazes de dar um decisivo impulso para a renovação da Igreja. Quem foi, então, Clara de Assis? Para responder a essa pergunta, possuímos fontes confiáveis: não somente as antigas biografias - como aquela de Tomás de Celano - mas também as Actas do processo de canonização, promovido pelo Papa apenas alguns meses depois da morte de Clara e que contêm os testemunhos daqueles que viveram ao seu lado durante muito tempo. Nascida em 1193, Clara pertencia a uma família aristocrática e rica. Renunciou à nobreza e à riqueza para viver humilde e pobre, adoptando a forma de vida que Francisco de Assis propunha. Apesar dos seus parentes, como então acontecia, estarem a planear o seu matrimónio com uma qualquer personalidade de destaque, Clara, aos 18 anos, num gesto ousado - inspirado pelo profundo desejo de seguir Cristo e pela admiração por Francisco - deixou a casa paterna e, em companhia de uma amiga, Bona di Guelfuccio, uniu-se secretamente aos frades menores junto à pequena igreja da Porciúncula. Era a noite de Domingo de Ramos de 1211. No meio da comoção geral, foi realizado um gesto altamente simbólico: enquanto os seus companheiros tinham nas mãos tochas acesas, Francisco cortou-lhe os cabelos e Clara recebeu um rude hábito penitencial. A partir daquele momento, tornou-se a virgem noiva de Cristo, humilde e pobre, e a Ele totalmente consagrada. Como Clara e as suas companheiras, inúmeras mulheres, ao longo da história, foram fascinadas pelo amor de Cristo que, na beleza da sua Divina Pessoa, preenche os seus corações. E toda a Igreja, por meio da mística vocação nupcial das virgens consagradas, apresenta-se como o que será para sempre: a Esposa bela e pura de Cristo. Numa das quatro cartas que Clara enviou a Inês de Praga, a filha do rei da Boêmia, que queria seguir os seus passos, fala de Cristo, seu amado esposo, com expressões nupciais, que podem surpreender, mas que comovem: "Amando-o, sereis casta; tocando-o, sereis mais pura; deixando-vos possuir por Ele, sereis virgem. O seu poder é mais forte, a sua generosidade mais elevada, o seu aspecto mais belo, o amor mais suave e toda a graça mais fina. Agora, estais apertada pelo abraço dele, que tendes adornado o vosso peito por pedras preciosas [...] e tendes-vos coroado com uma coroa de ouro gravada com o sinal da santidade" (Primeira carta: FF, 2862). Sobretudo no princípio de sua experiência religiosa, Clara tem em Francisco não somente um mestre a quem seguir os ensinamentos, mas também um amigo fraterno. A amizade entre esses dois santos constitui um aspecto muito bonito e importante. De facto, quando duas almas puras e inflamadas pelo mesmo amor por Deus se encontram, tiram da recíproca amizade um estímulo fortíssimo para percorrer a via da perfeição. A amizade é um dos sentimentos humanos mais nobres e elevados que a Graça divina purifica e transfigura (…) Após ter passado um período de alguns meses junto de outras comunidades monásticas, resistindo às pressões dos seus familiares que, inicialmente, não aprovaram a sua escolha, Clara estabelece-se com as primeiras companheiras na igreja de São Damião, onde os frades menores haviam edificado um pequeno mosteiro para elas. Naquele mosteiro, viveu durante mais de quarenta anos, até à sua morte, em 1253. Temos uma descrição, em primeira mão, de como viviam essas mulheres naqueles anos, nos inícios do movimento franciscano. Trata-se do relato do admirado bispo flamengo, em visita a Itália, Giacomo di Vitry, que afirma ter encontrado um grande número de homens e mulheres, de todas as classes sociais, que "deixaram todas as coisas por Cristo, fugiam do mundo. Chamavam-se frades menores e irmãs menores e eram tidos em grande consideração pelo senhor Papa e cardeais. [...] As mulheres [...] vivem juntas em diversas casas, não muito distantes da cidade. Nada recebem, mas vivem do trabalho das suas mãos. E estão profundamente tristes e atormentadas, porque são mais honradas do que gostariam pelos clérigos e leigos" (Lettera dell’ottobre 1216: FF, 2205.2207). Giacomo di Vitry captou com perspicácia um traço característico da espiritualidade franciscana a que Clara foi muito sensível: a radicalidade da pobreza, associada à confiança total na Providência Divina. Por essa razão, actuou com grande determinação, obtendo do Papa Gregório IX ou, provavelmente, já do Papa Inocêncio III, o assim chamado Privilegium Paupertatis (cfr. FF, 3279). Com base nele, Clara e as suas companheiras de São Damião não poderiam possuir nenhuma propriedade material. Tratava-se de uma excepção verdadeiramente extraordinária em relação ao direito canónico; as autoridades eclesiásticas daquele tempo permitiram-na por apreciar os frutos de santidade evangélica que reconheciam no modo de viver de Clara e das suas irmãs. Isso mostra que, também nos séculos da Idade Média, o papel das mulheres não era secundário, mas significativo. A esse respeito, deve salientar-se que Clara foi a primeira mulher na história da Igreja a compor uma Regra escrita, sujeita à aprovação do Papa, para que o carisma de Francisco de Assis fosse preservado em todas as comunidades femininas que se iam estabelecendo já nos seus tempos e que desejavam inspirar-se no exemplo de Francisco e Clara. No convento de São Damião, Clara praticou, de modo heroico, as virtudes que deveriam caracterizar todo o cristão: humildade, espírito de piedade e de penitência, caridade. Embora sendo superiora, desejava servir, pessoalmente, as irmãs, sujeitando-se também a tarefas humilíssimas: a caridade, de facto, supera todas as resistências e quem ama faz todos os sacrifícios com alegria. A sua fé na presença real da Eucaristia era tão grande que, em duas ocasiões, verificou-se um facto prodigioso: pela graça da exposição do Santíssimo Sacramento, afastaram-se os mercenários sarracenos, que estavam prestes a atacar o convento de São Damião e a devastar a cidade de Assis. Esses episódios, bem como outros milagres, dos quais se preserva a memória, levaram o Papa Alexandre IV a canonizá-la apenas dois anos após sua morte, em 1255, traçando um elogio na Bula de canonização, em que lemos: "Quão vivo é o poder desta luz e quão forte é o brilho desta fonte luminosa. Na verdade, essa luz tinha-se enclausurado no escondimento da vida monástica e irradiava luzes cintilantes; recolhia-se num mosteiro estreito, e expandia-se ao longo da vastidão do mundo. Mantinha-se dentro e difundia- se fora. Clara, de facto, escondia-se; mas a sua vida foi revelada a todos. Clara ficou em silêncio, mas sua fama gritava" (FF, 3284). E é exatamente assim, queridos amigos: são os santos aqueles que alteram o mundo para melhor; transformam-no de modo duradouro, incorporando as energias que somente o amor inspirado pelo Evangelho pode suscitar. Os santos são os grandes benfeitores da humanidade! (…) Gratos a Deus que nos dá os Santos que falam ao nosso coração e nos oferecem um exemplo de vida cristã a imitar, desejo concluir com as mesmas palavras de bênção que Clara compôs para as suas irmãs e que ainda hoje as Clarissas, que desempenham um precioso papel na Igreja com as suas orações e o seu trabalho, mantêm com grande devoção. São expressões das quais emerge toda a ternura da maternidade espiritual: "Abençoo-vos na minha vida e depois da minha morte, como posso e mais do que posso, com todas as bênçãos com as quais o Pai das misericórdias abençoou e abençoará no céu e na terra os filhos e filhas, e com as quais um pai e uma mãe espiritual abençoa e abençoará os seus filhos e as suas filhas espirituais. Amém" (FF, 2856).