Presença e Gratidão – Uma
missão solidária
Há momentos de dor que exigem de todos nós uma presença imediata,
uma atenção solidária e uma resposta eficaz para irmos ao encontro dos que
sofrem.
Os incêndios que têm atingido o nosso país em muitas das suas
regiões, desde as zonas mais rurais aos centros urbanos, vieram, mais uma vez,
dizer-nos como são frágeis as nossas seguranças e como correm risco as
populações portuguesas e os seus bens.
As vítimas humanas destes incêndios, os bens perdidos de tantas
famílias atingidas e a natureza sacrificada, sobretudo na sua área florestal,
clamam pela nossa comunhão fraterna e pela nossa proximidade solidária. A hora
é de dor diante deste flagelo recorrente em Portugal. Em horas de dor como esta
todos somos necessários para aliviar o sofrimento daqueles que foram diretamente
atingidos. Todos nós somos tocados por este drama e todos choramos as vítimas
humanas e os bens materiais. Os bens perdidos são tantas vezes a única fonte de
sobrevivência económica dos mais pobres das nossas terras!
Mas estas horas dolorosas são igualmente horas solidárias na
dedicação heróica das populações, dos bombeiros, dos membros da proteção civil,
dos agentes de segurança, dos autarcas, das instituições da sociedade civil e
da comunicação social no combate aos incêndios, na informação das pessoas, na
coordenação dos meios de ajuda e na sensibilização para a salvaguarda da vida e
dos bens de cada um de nós.
O melhor de Portugal, como povo congregado à volta das pessoas e
em torno das causas do bem, esteve presente e foi visível nestes dias em todas
as frentes adversas do combate aos incêndios. A determinação de muitos tornou
heróicos estes momentos dramáticos e a ajuda de todos fez solidária esta missão
difícil. Cumpre-nos este testemunho de gratidão a todas as pessoas que velaram
sem descanso e trabalharam sem desânimo, nestes dias, para minorar os danos
materiais e aliviar o sofrimento humano.
Também a Igreja esteve presente, como é seu dever e sua missão,
desde a primeira hora. Quisemos, concretamente na Diocese do Porto, nas
respostas dadas pelos párocos e pelas paróquias, pelos grupos e movimentos
cristãos e na intervenção da Cáritas Diocesana, particularmente em Arouca,
Baião, Marco de Canaveses, Gondomar e Vale de Cambra, estar com as populações e
com os agentes de combate aos incêndios. Continuaremos a fazê-lo, dia a dia,
até porque estamos conscientes de que vai ser longo e difícil o caminho
daqueles que tanto sofreram nestes dias e que viram magoada a sua alma e
perdidos muitos dos seus bens.
Lembro, a propósito, o que nos diz o Papa Francisco na encíclica ‘Laudato
Si’, quando se interroga: “O que está a acontecer à nossa Casa?”
“O clima - lembra o Papa Francisco - é um bem comum, um bem de
todos e para todos. A nível global, é um sistema complexo, que tem a ver com
muitas condições essenciais para a vida humana. Há um consenso científico muito
consistente, indicando que estamos perante um preocupante aquecimento do
sistema climático (LS n.º 23) … As mudanças climáticas são um problema global
com graves implicações ambientais, sociais, económicas, distributivas e
políticas, constituindo atualmente um dos principais desafios da sociedade.
Muitos pobres vivem em lugares particularmente afetados por fenómenos
relacionados com o aquecimento, e os seus meios de subsistência dependem
fortemente das reservas naturais e dos chamados serviços do ecossistema como a
agricultura, a pesca e os recursos florestais. Não possuem outras
disponibilidades económicas nem outros recursos que lhes permitam enfrentar
situações catastróficas e gozam de reduzido acesso a serviços sociais e de
proteção (LS n.º 25).
E o Papa Francisco adverte-nos, ainda, nesta mesma encíclica, que
a falta de reação diante destes dramas dos nossos irmãos e irmãs constitui um
sinal de perda do sentido de responsabilidade pelos nossos semelhantes, sobre o
qual se funda toda a sociedade civil (cf. LS n.º 25).
Devemos todos a esta luz e nesta chave de leitura, que o Papa
Francisco nos oferece, avaliar o que se passa em Portugal neste campo concreto
para não esquecermos que há muito a fazer a nível da educação, da prevenção, da
consciência cívica e da responsabilidade social de cada um pelo bem de todos.
Este é o caminho que devemos trilhar, porque a natureza é a nossa
casa comum onde nada deste mundo nos é indiferente.
Nesse caminho esta é a hora da presença solidária, da gratidão
fraterna e da esperança cristã que são os melhores sinalizadores para quem quer
preparar e construir o futuro.
Porto, 10 de agosto de 2016
António, Bispo do Porto