PALAVRA COM SENTIDO

PALAVRA COM SENTIDO “… Enviou-me para anunciar a boa nova aos pobres…” (cf. Lucas 4, 18) “…No evangelho de hoje, o evangelista Lucas, antes de apresentar o discurso programático de Jesus em Nazaré, sintetiza, brevemente, a sua actividade evangelizadora. É uma actividade que Ele cumpre com o poder do Espírito Santo: a sua palavra é original, porque revela o sentido das Escrituras; é uma palavra influente, porque manda até nos espíritos impuros e eles obedecem (cf. Mc 1, 27). Jesus é diferente dos mestres do seu tempo: por exemplo, não abriu uma escola para o estudo da Lei, mas andava por toda parte pregando e ensinando: nas sinagogas; pelas estradas; nas casas… sempre a caminho! Jesus é diferente, também, em comparação com João Baptista que proclama o julgamento iminente de Deus, ao passo que Jesus anuncia o seu perdão de Pai. E, agora, imaginemos que entramos, também nós, na sinagoga de Nazaré, a aldeia onde Jesus cresceu até cerca dos trinta anos. O que ali acontece é um evento importante, que delineia a missão de Jesus. Ele levanta-se para ler a Sagrada Escritura. Abre o rolo do profeta Isaías e lê o trecho onde está escrito: «O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu; enviou-me para anunciar a boa nova aos pobres» (Lc 4, 18). Em seguida, após um momento de silêncio, cheio de expectativa por parte de todos, diz, entre a estupefacção geral: «Cumpriu-se, hoje mesmo, esta passagem da Escritura que acabais de ouvir» (v. 21). Evangelizar os pobres: esta é a missão de Jesus, segundo quanto Ele diz; esta é, inclusive, a missão da Igreja, e de cada baptizado, na Igreja. Ser cristão e ser missionário é a mesma coisa. Anunciar o Evangelho, com a palavra e, ainda mais, com a vida, é a finalidade principal da comunidade cristã e de cada um dos seus membros. Observa-se, aqui, que Jesus dirige a Boa Nova a todos, sem excluir ninguém; aliás, privilegiando os mais distantes, os sofredores, os doentes, os descartados da sociedade. Questionemo-nos: o que significa evangelizar os pobres? Significa, em primeiro lugar, aproximarmo-nos deles; ter a alegria de os servir; de os libertar da opressão. E, tudo isto, em nome de Cristo e com o Espírito de Cristo, porque é Ele o Evangelho de Deus; é Ele a Misericórdia de Deus; é Ele a libertação de Deus; é Ele quem se fez pobre para nos enriquecer com a sua pobreza. O texto de Isaías, enriquecido com pequenos ajustes introduzidos por Jesus, indica que o anúncio messiânico do Reino de Deus, que veio a nós, destina-se, de maneira preferencial, aos marginalizados, aos prisioneiros, aos oprimidos. Provavelmente, no tempo de Jesus, estas pessoas não estavam no centro da comunidade de fé. Podemos perguntar-nos: hoje, nas nossas comunidades paroquiais, nas associações, nos movimentos, somos fiéis ao programa de Cristo? A evangelização dos pobres - levar-lhes a boa nova - é a prioridade? Atenção: não se trata só de fazer assistência social, tão-pouco actividade política. Trata-se de oferecer a força do Evangelho de Deus, que converte o coração; sara as feridas; transforma as relações humanas e sociais segundo a lógica do amor. Com efeito, os pobres estão no centro do Evangelho. A Virgem Maria, Mãe dos evangelizadores, nos ajude a sentir fortemente a fome e a sede do Evangelho que existe no mundo, especialmente no coração e na carne dos pobres. E conceda, a cada um de nós e a cada comunidade cristã, testemunhar concretamente a misericórdia, a grande misericórdia que Cristo nos doou…” (Papa Francisco, Oração do Angelus, 24 de Janeiro de 2016 – III Domingo do Tempo Comum)

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

PALAVRA DO PAPA FRANCISCO


- na Audiência-Geral,  na Praça de São Pedro - Roma, no dia 7 de Setembro de 2016

Bom dia, prezados irmãos e irmãs!

Ouvimos um trecho do Evangelho de Mateus (11, 2-6). A intenção do evangelista consiste em fazer-nos entrar mais profundamente no mistério de Jesus, para compreender a sua bondade e a sua misericórdia. O episódio é o seguinte: João Baptista manda os seus discípulos ao encontro de Jesus - João estava na prisão - para lhe fazer uma pergunta muito clara: «És Tu aquele que deve vir, ou devemos esperar por outro?» (v. 3). Era precisamente o momento da escuridão... João Baptista esperava ansiosamente o Messias e, na sua pregação, já o descrevera com expressões fortes, como um juiz que finalmente viria instaurar o reino de Deus e purificar o seu povo, recompensando os bons e castigando os maus. E pregava assim: «O machado já está posto à raiz das árvores: toda a árvore que não produzir bons frutos será cortada e lançada ao fogo» (Mt 3, 10). Agora, Jesus dá início à sua missão pública com um estilo diferente; João sofre porque se encontra numa dupla obscuridade: na escuridão do cárcere e de uma cela, e na escuridão do coração. Não entende o estilo de Jesus e quer saber se é realmente Ele o Messias, ou então se deve esperar por outro.
E à primeira vista, a resposta de Jesus não parece corresponder à interrogação de João Baptista. Com efeito, Jesus diz: «Ide e contai a João o que ouvistes e o que vistes: os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos são limpos, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam, o Evangelho é anunciado aos pobres... Bem-aventurado aquele para quem eu não for ocasião de escândalo!» (vv. 4-6). Aqui, a intenção do Senhor Jesus torna-se clara: Ele responde que é o instrumento concreto da misericórdia do Pai; que vai ao encontro de todos, levando a consolação e a salvação e, deste modo, manifesta o juízo de Deus. Os cegos, os coxos, os leprosos e os surdos recuperam a sua dignidade e já não vivem excluídos por causa da sua enfermidade; os mortos voltam a viver, enquanto aos pobres é anunciada a Boa Notícia. E esta torna-se a síntese do agir de Jesus, que desta forma torna visível e tangível a acção do próprio Deus.
A mensagem que a Igreja recebe desta narração da vida de Cristo é muito clara. Deus não mandou o seu Filho ao mundo para punir os pecadores, nem para aniquilar os malvados. Pelo contrário, é-lhes dirigido o convite à conversão, a fim de que, vendo os sinais da bondade divina, possam encontrar o caminho de volta. Como diz o Salmo: «Se tiverdes em conta os nossos pecados, Senhor / Senhor, quem poderá subsistir diante de vós? / Mas é em Vós que se encontra o perdão... / e é assim que vos temeremos» (130, 3-4).
A justiça que João Baptista punha no centro da sua pregação, em Jesus manifesta-se, em primeiro lugar, como misericórdia. E as dúvidas do Precursor simplesmente antecipam a perplexidade que Jesus suscitará em seguida com os seus gestos e com as suas palavras. Então, compreende-se a conclusão da resposta de Jesus. Ele diz: «Bem-aventurado aquele para quem eu não for ocasião de escândalo!» (v. 6). Escândalo significa «obstáculo». Por isso, Jesus chama a atenção para um perigo particular: se os obstáculos à crença são sobretudo as suas acções de misericórdia, isto significa que temos uma imagem falsa do Messias. Ao contrário, bem-aventurados aqueles que, diante dos gestos e das palavras de Jesus, dão glória ao Pai que está no Céu.
A admoestação de Jesus é sempre actual: ainda hoje, o homem constrói imagens de Deus que o impedem de sentir a sua presença real. Alguns modelam uma fé «particular» que reduz Deus ao espaço limitado dos próprios desejos e das próprias convicções. Mas, esta fé não é conversão ao Senhor que se revela; pelo contrário, impede-o de estimular a nossa vida e a nossa consciência. Outros reduzem Deus a um ídolo falso; usam o seu nome santo para justificar os seus interesses ou até o ódio e a violência. Para outros ainda, Deus é somente um refúgio psicológico no qual se sentem seguros nos momentos difíceis: trata-se de uma fé fechada em si mesma, impermeável à força do amor misericordioso de Jesus que impele rumo aos irmãos. E, outros ainda consideram Cristo apenas um bom mestre de ensinamentos éticos, um dos muitos da história. Há, finalmente, aqueles que sufocam a fé numa relação puramente intimista com Jesus, anulando o seu impulso missionário, capaz de transformar o mundo e a história. Nós, cristãos, acreditamos no Deus de Jesus Cristo e o nosso desejo consiste em crescer na experiência viva do seu mistério de amor.

Por conseguinte, comprometamo-nos a não levantar obstáculo algum à acção misericordiosa do Pai, mas peçamos o dom de uma fé grande para nos tornarmos, também nós, sinais e instrumentos de misericórdia.  (cf. Santa Sé)