PALAVRA COM SENTIDO

PALAVRA COM SENTIDO “… Permanecei no meu amor…" (cf. João 15, 9) “…Neste tempo pascal a Palavra de Deus continua a indicar-nos estilos de vida coerentes para sermos a comunidade do Ressuscitado. Entre eles, o Evangelho de hoje apresenta a recomendação de Jesus: «Permanecei no meu amor» (Jo 15, 9): permanecer no amor de Jesus. Habitar na corrente do amor de Deus. Habitar estavelmente nele, é a condição para fazer com que o nosso amor não perca, pelo caminho, o seu fervor e a sua audácia. Também nós, como Jesus e n’Ele, devemos acolher com gratidão o amor que vem do Pai e permanecer neste amor, procurando não nos separarmos dele, com o egoísmo e com o pecado. É um programa exigente, mas não impossível. Antes de mais, é importante tomar consciência de que o amor de Cristo não é um sentimento superficial: não!... É uma atitude fundamental do coração, que se manifesta vivendo como Ele quer. Com efeito, Jesus afirma: «Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor; do mesmo modo que eu tenho guardado os mandamentos de meu Pai, e permaneço no seu amor» (v. 10). O amor realiza-se na vida de cada dia, nas atitudes e nas acções; se assim não for, é apenas algo ilusório. São palavras, palavras, palavras: isto não é amor. O amor é concreto, todos os dias. Jesus pede-nos para observar os seus mandamentos, que se resumem nisto: «que vos ameis uns aos outros como eu vos amei» (v. 12). Como fazer para que este amor, que o Senhor ressuscitado nos oferece, possa ser partilhado pelos outros? Várias vezes, Jesus indicou o outro que devemos amar, não por palavras mas por obras. É aquele que encontro no meu caminho e que, com o seu rosto e com a sua história, me interpela; é aquele que, com a sua presença, me leva a sair dos meus interesses e das minhas seguranças; é aquele que espera a minha disponibilidade para ouvir e percorrer um pouco de caminho juntos. Disponibilidade em relação ao irmão e irmã, quem quer que ele seja e qual for a situação em que se encontra, começando por quem está próximo de mim na família, na comunidade, no trabalho, na escola... Desta maneira, se eu permanecer unido a Jesus, o seu amor pode alcançar o outro e atraí-lo a si, à sua amizade. E este amor pelos outros não pode acontecer só em momentos extraordinários, mas deve tornar-se a constante da nossa existência. Eis por que somos chamados, por exemplo, a cuidar dos idosos, como um tesouro precioso e com amor, mesmo se causam problemas económicos e inconvenientes; mas devemos cuidar deles. Eis por que devemos dar aos doentes, até no último estádio, toda a assistência possível. Eis por que se devem acolher sempre os nascituros; eis por que, em síntese, a vida deve ser sempre tutelada e amada, desde a conceção até ao seu fim natural. E isto é amor. Nós somos amados por Deus, em Jesus Cristo, que nos pede para nos amarmos como Ele nos ama. Mas não podemos fazer isto se não tivermos em nós o mesmo Coração. A Eucaristia, na qual somos chamados a participar todos os domingos, tem a finalidade de formar em nós o Coração de Cristo, de modo que toda a nossa vida seja guiada pelas suas atitudes generosas. A Virgem Maria nos ajude a permanecer no amor de Jesus e a crescer no amor para com todos, sobretudo para com os mais débeis, a fim de corresponder plenamente à nossa vocação cristã…” (Papa Francisco, 6 de maio de 2018)

segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

PALAVRA DO PAPA FRANCISCO


- Homilia do Papa, na Basílica de São Paulo Extramuros – Roma, no dia 25 de Janeiro, festa da Conversão de São Paulo e termo da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos

O encontro com Jesus na estrada para Damasco transforma radicalmente a vida de Paulo. A partir de então, para ele, o sentido da existência já não está em confiar nas próprias forças para observar escrupulosamente a Lei, mas em aderir com todo o seu ser ao amor gratuito e imerecido de Deus, a Jesus Cristo crucificado e ressuscitado. Conhece, assim, a irrupção duma vida nova, a vida segundo o Espírito, na qual, pelo poder do Senhor ressuscitado, experimenta perdão, confidência e conforto. E Paulo não pode guardar para si mesmo esta novidade: é impelido pela graça a proclamar a feliz notícia do amor e da reconciliação que Deus oferece plenamente em Cristo à humanidade.
Para o Apóstolo dos Gentios, a reconciliação do homem com Deus, da qual foi feito embaixador (cf. 2 Cor 5, 20), é um dom que vem de Cristo. Vê-se isto claramente no texto da II Carta aos Coríntios, onde se foi buscar, este ano, o tema da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos: «O amor de Cristo impele-nos para a reconciliação» (cf. 2 Cor 5, 14-20). «O amor de Cristo»: não se trata do nosso amor por Cristo, mas do amor que Cristo tem por nós. Da mesma forma, a reconciliação para a qual somos impelidos não é simplesmente iniciativa nossa: é primariamente a reconciliação que Deus nos oferece em Cristo. Antes de ser esforço humano de crentes que procuram superar as suas divisões, é um dom gratuito de Deus. Como resultado deste dom, a pessoa perdoada e amada é chamada, por sua vez, a proclamar o evangelho da reconciliação em palavras e obras, a viver e dar testemunho duma existência reconciliada.
Nesta perspectiva, podemos hoje perguntar-nos: Como é possível proclamar este evangelho de reconciliação depois de séculos de divisões? O próprio Paulo nos ajuda a encontrar o caminho. Ele sublinha que a reconciliação em Cristo não se pode realizar sem sacrifício. Jesus deu a sua vida, morrendo por todos. De modo semelhante os embaixadores de reconciliação, em seu nome, são chamados a dar a vida, a não viver mais para si mesmos, mas para Aquele que morreu e ressuscitou por eles (cf. 2 Cor 5, 14-15). Como ensina Jesus, só quando perdemos a vida por amor d’Ele é que verdadeiramente a temos ganha (cf. Lc 9, 24). É a revolução que Paulo viveu, mas é também a revolução cristã de sempre: deixar de viver para nós mesmos, buscando os nossos interesses e promoção da nossa imagem, mas reproduzir a imagem de Cristo, vivendo para Ele e de acordo com Ele, com o seu amor e no seu amor.
Para a Igreja, para cada Confissão Cristã, é um convite a não se basear em programas, cálculos e benefícios, a não se abandonar a oportunidades e modas passageiras, mas a procurar o caminho com o olhar sempre fixo na cruz do Senhor: lá está o nosso programa de vida. É um convite também a sair de todo o isolamento, a superar a tentação da autorreferência, que impede de individuar aquilo que o Espírito Santo realiza fora do nosso próprio espaço. Poderá realizar-se uma autêntica reconciliação entre os cristãos, quando soubermos reconhecer os dons uns dos outros e formos capazes, com humildade e docilidade, de aprender uns dos outros – aprender uns dos outros –, sem esperar que primeiro sejam os outros a aprender de nós.
Se vivermos este morrer para nós mesmos por amor de Jesus, o nosso estilo velho de vida é relegado para o passado e, como aconteceu a São Paulo, entramos numa nova forma de existência e comunhão. Com Paulo, poderemos dizer: «O que era antigo passou» (2 Cor 5, 17). Olhar para trás é útil e muito necessário para purificar a memória, mas fixar-se no passado, delongando-se a lembrar as injustiças sofridas e cometidas e julgando com parâmetros apenas humanos, pode paralisar e impedir de viver o presente. A Palavra de Deus encoraja-nos a tirar força da memória, a recordar o bem recebido do Senhor; mas pede-nos também que deixemos o passado para trás a fim de seguir Jesus no presente e, n’Ele, viver uma vida nova. Àquele que renova todas as coisas (cf. Ap 21, 5), consintamos-Lhe de nos orientar para um futuro novo, aberto à esperança que não desilude, um futuro onde será possível superar as divisões e os crentes, renovados no amor, encontrar-se-ão plena e visivelmente unidos.
Enquanto avançamos pelo caminho da unidade, recordamos este ano de modo particular o quinto centenário da Reforma Protestante. O facto de católicos e luteranos poderem hoje recordar, juntos, um evento que dividiu os cristãos e de o fazerem com a esperança posta sobretudo em Jesus e na sua obra de reconciliação, constitui um marco significativo, alcançado – graças a Deus e à oração – através de cinquenta anos de mútuo conhecimento e de diálogo ecuménico.
Implorando de Deus o dom da reconciliação com Ele e entre nós, dirijo as minhas cordiais e fraternas saudações a Sua Eminência o Metropolita Gennadios, representante do Patriarcado Ecuménico, a Sua Graça David Moxon, representante pessoal em Roma do Arcebispo de Cantuária, e a todos os representantes das diversas Igrejas e Comunidades eclesiais aqui reunidos. Saúdo com particular alegria os membros da Comissão Mista para o Diálogo Teológico entre a Igreja Católica e as Igrejas Ortodoxas Orientais, a quem desejo um fecundo trabalho na Sessão Plenária que se desenrola nestes dias. Saúdo também os alunos do Instituto Ecuménico de Bossey – vi-os esta manhã muito contentes –, que visitam Roma para aprofundar o seu conhecimento da Igreja Católica, e os jovens ortodoxos e todos os ortodoxos orientais que estudam em Roma, graças às bolsas de estudo do Comité de Colaboração Cultural com as Igrejas Ortodoxas, sediado no Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade dos Cristãos. Aos Superiores e a todos os Colaboradores deste Dicastério, exprimo a minha estima e gratidão.
Amados irmãos e irmãs, a nossa oração pela unidade dos cristãos é participação na oração que Jesus dirigiu ao Pai, antes da Paixão, «para que todos sejam um só» (Jo 17, 21). Nunca nos cansemos de pedir a Deus este dom. Na expectativa paciente e confiada de que o Pai conceda a todos os crentes o bem da plena comunhão visível, prossigamos o nosso caminho de reconciliação e diálogo, encorajados pelo testemunho heroico de tantos irmãos e irmãs, de ontem e de hoje, unidos no sofrimento pelo nome de Jesus. Aproveitemos todas as oportunidades que a Providência nos oferece para rezar juntos, anunciar juntos, amar e servir juntos sobretudo quem é mais pobre e negligenciado. (cf. Santa Sé)