SÃO JOÃO DE
BRITO (recordando)
João de Brito foi o terceiro e último filho de D.
Salvador Pereira de Brito, Fidalgo da
Casa Real e Alcaide-Mor de Alter do Chão, e de Dona Brites Pereira. Nasceu em
Lisboa, no dia 1de Março de 1647.
Ainda criança, o seu pai foi mandado para Brasil, pelo
Rei D. João IV, para desempenhar as funções de governador do Rio de Janeiro. Aí
faleceu, no dia 20 de Junho de 1651, sem mais tornar a ver a família.
Coube, assim, a Dona Brites a tarefa de educar os seus
filhos, formando-os na escola do amor e do temor de Deus. João, o mais novo,
com a idade de nove anos, foi enviado para a Corte, na qualidade de pajem do
infante D. Pedro. Graças à sua força de carácter e ao seu coração generoso,
nunca se envergonhou de testemunhar a sua piedade e o seu amor a Jesus no meio
dos seus companheiros de jogos e de estudos. Por isso, nem sempre era bem visto
e, muitas vezes, tornou-se motivo de chacota e de injúrias da parte dos seus
condiscípulos. Por causa destas contrariedades, que assumia com simplicidade e
valentia, começaram a chamar-lhe na Corte, profeticamente, “o mártir”.
Impressionado com a vida de São Francisco Xavier, por
quem nutria uma terna devoção, João aspirou, desde muito cedo, a seguir o seu
exemplo, consagrando-se um dia ao apostolado na Índia.
João contraiu uma terrível doença, que parecia ser
mortal. Neste estado crítico, julgou que iriam cair por terra todos os seus
projectos. Mas, Dona Brites não se deixou abater: prometeu ao Apóstolo das
Índias que, se o seu filho recobrasse a saúde, vesti-lo-ia com o traje da
Companhia de Jesus durante um ano. E a sua oração foi ouvida.
Para o menino, era um gozo acompanhar o infante D.
Pedro, na qualidade de pajem, assim vestido como o seu patrono. Isto fez com
que lhe dessem um outro apelido: o “Apostolinho”, pois os filhos de Santo
Inácio, pelo seu zelo apostólico, eram em Portugal conhecidos como Apóstolos.
João afeiçoou-se de tal maneira ao traje que usava,
que não mais queria tirá-lo. Por isso, tendo completado os catorze anos de
idade, entrou para o noviciado jesuíta em Lisboa, apesar de todas as
dificuldades que lhe levantaram quer na Corte, quer na sua família.
Animado de zelo apostólico, João de Brito entregou-se,
com ardor e sucesso, ao estudo das belas-artes, da filosofia e da teologia,
distinguindo-se também pela piedade e pela observância religiosa.
Durante o noviciado, aumentou o seu desejo de seguir
as pisadas de São Francisco Xavier. Por isso, implorou insistentemente ao seu
superior, o Geral da Companhia, e ao Rei que lhe concedessem a possibilidade de
partir para a Índia. A sua mãe remexeu céus e terra para demovê-lo desse desejo
e poder conservá-lo no reino. Mas a vontade de João de Brito em seguir a inspiração
divina levou a melhor, e ele, pouco depois de ordenado sacerdote, acompanhado
de 17 outros missionários, partiu rumo ao destino tão almejado.
A viagem foi feliz até às costas da Guiné. Aqui, o navio
ficou à mercê da calmaria e, devido às más condições de vida a bordo, surgiu
uma grave epidemia. Embora também atingido, João de Brito dedicou-se, com tanto
empenho e amor, aos doentes que o cognominaram como o Novo Xavier. Ele implorou
o auxílio do Apóstolo das Índias e, subitamente, um vento promissor inflou
novamente as velas das caravelas portuguesas. No Cabo da Boa Esperança – antes
conhecido como o Cabo das Tormentas – uma terrível tempestade pôs em risco o
navio. Graças às orações de João de Brito ao seu patrono, voltou a bonança, que
os levou até às costas da Índia.
Na capital da Índia portuguesa, os passageiros e a
tripulação apressaram-se a ir ao túmulo de São Francisco Xavier para agradecer os
seus favores. O Pe. João de Brito consagrou, então, o seu apostolado ao seu
santo patrono, pedindo-lhe o zelo e o ardor de que necessitava para o seu
ministério.
Em Goa, enquanto esperava a nomeação para outro lugar,
João de Brito dedicou-se à evangelização da parte mais abandonada da sociedade.
Foi, depois, enviado para o colégio de Ambalacate, no sul da Índia, para o
estudo das línguas locais.
Mais tarde, o Pe. Brito foi designado para a missão de
Madurai, uma das mais difíceis missões dos Padres Jesuítas. O Pe. João de Brito
devotou-se, de corpo e alma, aos seus neófitos, obtendo, em pouco tempo,
brilhante resultado, uma vez que “os prodígios mais surpreendentes do seu zelo
davam ao seu ministério uma maravilhosa eficiência: povoados inteiros de pagãos
convertiam-se ao Evangelho, e formavam novas cristandades que rivalizavam em
fervor com as antigas”.
Impressionados com este sucesso e sobretudo pela fama
de santidade do Pe. Brito, os seus superiores confiaram-lhe toda a missão do
Madurai.
Naquela época esta região era formada por vários
reinos independentes, todos em estado de anarquia. Os brâmanes - líderes religiosos
da maioria da população – aproveitavam-se da sua influência para virar as
populações contra os missionários cristãos, que cada vez ganhavam mais terreno,
perseguindo os convertidos. O Pe. João de Brito corria de povoado em povoado
para socorrer os cristãos.
No ano de 1669, uma sangrenta perseguição quase
aniquilou a cristandade do Maravá, uma das mais promissoras. Os que conseguiram
escapar da morte ou do exílio refugiaram-se nas florestas ou nas vizinhas
aldeias cristãs. Mas, aos poucos, graças ao zelo de alguns catequistas, aquele
pequeno número foi novamente congregado e, renovado no seu fervor, tornou-se
evangelizador, convertendo muitos pagãos ao amor de Jesus. Esta acção
missionária da comunidade suscitou uma nova perseguição, em 1686. O Pe. João de
Brito apressou-se a ir em socorro dos perseguidos, disposto a participar, se
necessário, da sua sorte. Fortaleceu os tíbios, socorreu os doentes,
administrou os sacramentos com tanto empenho e fruto, que chegou, em apenas
dois meses, a receber na Igreja mais de dois mil pagãos. Isto valeu-lhe a
prisão com terríveis torturas. Só não recebeu o martírio nessa ocasião porque o
Marajá do Maravá mandou libertá-lo e proibiu-o de pregar nos seus Estados.
Pouco tempo depois, o provincial chamou-o a Portugal e
a Roma para tratar de negócios da missão.
A fama do missionário precedera-o, tendo sido recebido
com entusiasmo na capital do reino. Todos disputavam a sua presença. O rei D.
Pedro II quis retê-lo a todo custo na corte, como formador dos seus filhos. Mas
ele soube subtrair-se a todas as tentativas, inclusive a de fazê-lo arcebispo.
Recolhendo também auxílio material para seus protegidos, empreendeu a viagem de
volta ao seu campo de trabalho.
Em 1691, João de Brito voltou ao Maravá, apesar da
perseguição dos brâmanes. Como o seu patrono, São Francisco Xavier, havia dias
em que ficava com os braços quase inanimados de tanto administrar o baptismo.
Entre os novos convertidos estava o príncipe
Tariadevém, que, involuntariamente, seria a causa da sua morte.
Para o receber na Igreja, João de Brito impôs como
condição que ele escolhesse uma só esposa, afastando as demais. O generoso
pagão assim o fez, repudiando as esposas secundárias. Uma delas era sobrinha do
rajá do Maravá. Este, para “vingá-la”, não se atrevendo a fazer nada contra o
príncipe, mandou saquear e queimar as igrejas cristãs e prender o missionário.
Depois de toda a espécie de injúrias e maus tratos
contra João de Brito, o tirano - a pedido do príncipe convertido – comutou-lhe
a pena de morte a que tinha sido condenado e exilou-o em terras do seu irmão.
Mas, a este mandou uma mensagem secreta para que o missionário fosse executado.
Na véspera do seu martírio, escrevendo ao superior da
missão, João de Brito falou da sua morte iminente: “Quando a culpa é virtude, o
padecer é glória”.
Já no local do suplício, o padre jesuíta avançou para os
seus perseguidores e pediu-lhes somente alguns minutos para preparar-se para a
morte. “Caiu imediatamente de joelhos e, a face voltada para o oriente,
permaneceu como que elevado em êxtase. Entretanto, uma multidão inumerável
cercava o local; e, um pouco mais longe, permanecia um grupo de cristãos que
quiseram seguir o seu Pai até o fim da sua carreira. Todos - pagãos e cristãos
- tinham os olhos fixos no homem de Deus e, unidos num mesmo sentimento de
admiração, pareciam respeitar, em inteiro silêncio, a prece do mártir.
Entretanto, chegou o carrasco encarregado da execução, com uma cimitarra na
mão. Não ousando interromper a prece do condenado, maquinalmente pegou numa
pedra aguda e começou a afiar a sua arma. Um enviado do ministro apressou-o a
cumprir as suas ordens. O Pe. João de Brito fez, então, o Sinal da Cruz,
levantou-se e, com o rosto resplandecente duma alegria divina, avançou para o
carrasco, abraçando-o afectuosamente e dizendo-lhe: ‘Meu amigo, eu já rezei ao
meu Deus; fiz o que devia fazer; executa agora a ordem que te foi dada’.
O carrasco, emocionado, teve de repetir os golpes até
decepar aquela cabeça venerável. Depois, segundo a ordem que havia recebido,
decepou os pés e as mãos do mártir; prendeu-os à cabeça decepada e ao resto do
tronco, colocando tudo no alto de um poste para que todos vissem. Era o dia 4
de Fevereiro de 1693.
O local do martírio ficou guardado por soldados, para
impedir os cristãos de pegarem as sagradas relíquias do P. João de Brito. Nas
noites seguintes, pairou sobre elas uma misteriosa luz. Depois surgiram umas
feras que devoraram, quase por completo, o corpo de João de Brito. Algum tempo
depois, os cristãos recolheram alguns restos de despojos encontrados e enviaram-nos
para o Colégio São Paulo, de Goa.
Imediatamente o nome do mártir tornou-se objecto de
veneração e numerosos milagres foram operados por sua intercessão. João de
Brito foi beatificado pelo Papa Pio IX, na
Basílica de São Pedro, no dia 21 de Agosto de 1853, e canonizado pelo Papa Pio
XII, no dia 22 de Junho de 1947.
A memória litúrgica de São João de Brito é celebrada
no dia 4 de Fevereiro.