- O PAPA FRANCISCO NO EGIPTO
O Papa Francisco esteve no Egipto, nos dias 28 e
29 de Abril, numa visita apostólica carregada de sentimentos de solidariedade,
de comunhão fraterna e de testemunho de fé em Jesus Cristo. Com um programa centrado
no Cairo, capital do Egipto, o Papa apresentou-se como “peregrino da paz”, em
busca de diálogo entre as várias confissões cristãs e a maioria muçulmana do
país. O Papa declarou que o mundo precisa de construtores de pontes de paz, de
diálogo, de fraternidade, de justiça e de humanidade. O Papa Francisco quis
levar ao Egipto uma mensagem de amizade, com fortes apelos à fraternidade e à
reconciliação entre judeus, cristãos e muçulmanos. O Papa quis que a sua visita
fosse ainda “um abraço de consolação e encorajamento a todos os cristãos do
Médio Oriente”.
Nesta sua visita, o Papa e o Patriarca da Igreja
Copta assinaram uma declaração transcrevemos:
DECLARAÇÃO COMUM DE SUA
SANTIDADE FRANCISCO E DE SUA SANTIDADE TAWADROS II
1. Nós, Francisco, Bispo de Roma e Papa da Igreja Católica, e Tawadros
II, Papa de Alexandria e Patriarca da Sé de São Marcos, no Espírito Santo damos
graças a Deus por nos ter concedido a feliz oportunidade de nos encontrarmos
mais uma vez, trocarmos o abraço fraterno e juntarmo-nos novamente em oração
comum. Damos glória ao Todo-Poderoso pelos laços de fraternidade e amizade
existentes entre a Sé de São Pedro e a Sé de São Marcos. O privilégio de estar
juntos aqui no Egipto é um sinal de que a solidez do nosso relacionamento tem
aumentado de ano para ano e de que estamos a crescer na proximidade, na fé e no
amor de Cristo nosso Senhor. Damos graças a Deus pelo amado Egipto, «terra
natal que vive dentro de nós», como costumava dizer Sua Santidade Papa Shenouda
III, «povo abençoado pelo Senhor» (cf. Is 19, 25) com a sua antiga civilização
dos Faraós, a herança grega e romana, a tradição copta e a presença islâmica. O
Egipto é o lugar onde a Sagrada Família encontrou refúgio, é terra de mártires
e de santos.
2. O nosso vínculo profundo de amizade e fraternidade tem a sua
origem na plena comunhão que existia entre as nossas Igrejas nos primeiros
séculos, tendo-se expressado de várias maneiras nos primeiros Concílios
Ecuménicos, a começar pelo Concílio de Nicéia, em 325, e a contribuição de
Santo Atanásio, corajoso Padre da Igreja que mereceu o título de «Protector da
Fé». A nossa comunhão manifestava-se através da oração e práticas litúrgicas
semelhantes, da veneração dos mesmos mártires e santos, e no fomento e difusão
do monaquismo, seguindo o exemplo do grande Santo Antão, conhecido como o pai
de todos os monges.
Esta experiência comum de comunhão, anterior ao tempo de
separação, assume um significado especial na nossa busca actual do
restabelecimento da plena comunhão. A maior parte das relações que existiam nos
primeiros séculos continuaram, apesar das divisões, entre a Igreja Católica e a
Igreja Copta Ortodoxa até ao dia de hoje e recentemente foram mesmo
revitalizadas. Estas desafiam-nos a intensificar os nossos esforços comuns,
perseverando na busca duma unidade visível na diversidade, sob a guia do
Espírito Santo.
3. Recordamos, com gratidão, o encontro histórico de há quarenta e
quatro anos entre os nossos predecessores Papa Paulo VI e Papa Shenouda III,
aquele abraço de paz e fraternidade depois de muitos séculos em que os nossos
vínculos mútuos de amor não tiveram possibilidade de se expressar devido à
distância que se criara entre nós. A Declaração Comum, que eles assinaram em 10
de Maio de 1973, representou um marco no caminho ecuménico e serviu como ponto
de partida para a instituição da Comissão de Diálogo Teológico entre as nossas
duas Igrejas, que produziu muito fruto e abriu o caminho para um diálogo mais
amplo entre a Igreja Católica e toda a família das Igrejas Ortodoxas Orientais.
Naquela Declaração, as nossas Igrejas reconheceram que, no sulco da tradição
apostólica, professam «uma só fé no Deus Uno e Trino» e «a divindade do
Unigénito Filho de Deus (...) perfeito Deus, quanto à sua divindade, e perfeito
homem quanto à sua humanidade». Reconheceu-se também que «a vida divina é-nos
dada e alimentada em nós pelos sete sacramentos» e que «veneramos a Virgem
Maria, Mãe da verdadeira Luz», a «Theotókos».
4. Com profunda gratidão, recordamos o encontro fraterno que nós
próprios tivemos em Roma, a 10 de Maio de 2013, e a instituição do dia 10 de Maio
como jornada anual em que aprofundamos a amizade e a fraternidade entre as
nossas Igrejas. Este renovado espírito de proximidade permitiu-nos discernir
ainda melhor como o vínculo que nos une foi recebido de nosso único Senhor no
dia do Baptismo. Com efeito, é através do Baptismo que nos tornamos membros do
único Corpo de Cristo que é a Igreja (cf. 1 Cor 12, 13). Esta herança comum é a
base da peregrinação que juntos realizamos rumo à plena comunhão, crescendo no
amor e na reconciliação.
5. Conscientes de que ainda há tanto caminho a fazer nesta
peregrinação, recordamos o muito que já foi alcançado. Em particular, lembramos
o encontro entre Papa Shenouda III e São João Paulo II, que veio como peregrino
ao Egipto durante o Grande Jubileu do ano 2000. Estamos determinados a seguir
os seus passos, movidos pelo amor de Cristo Bom Pastor, na convicção profunda
de que, caminhando juntos, crescemos em unidade. Para isso auferimos a força de
Deus, fonte perfeita de comunhão e de amor.
6. Este amor encontra a sua expressão mais alta na oração comum.
Quando os cristãos rezam juntos, chegam a compreender que aquilo que os une é
muito maior do que aquilo que os divide. O nosso desejo ardente de unidade
encontra inspiração na oração de Cristo «para que todos sejam um só» (Jo 17,
21). Para isso, aprofundemos as raízes que compartilhamos na única fé
apostólica, rezando juntos e procurando traduções comuns do Pai Nosso e uma
data comum para a celebração da Páscoa.
7. Enquanto caminhamos para o dia abençoado em que finalmente nos
reuniremos à mesma Mesa Eucarística, podemos colaborar em muitas áreas e tornar
tangível a grande riqueza que já temos em comum. Podemos testemunhar juntos
certos valores fundamentais como a sacralidade e dignidade da vida humana, a
sacralidade do matrimónio e da família, e o respeito por toda a criação, que
Deus nos confiou. Não obstante a multiplicidade de desafios contemporâneos,
como a secularização e a globalização da indiferença, somos chamados a oferecer
uma resposta compartilhada, baseada nos valores do Evangelho e nos tesouros das
nossas respectivas tradições. Nesta linha, somos encorajados a aprofundar o
estudo dos Padres Orientais e Latinos e promover um frutuoso intercâmbio na
vida pastoral, especialmente na catequese e num mútuo enriquecimento espiritual
entre comunidades monásticas e religiosas.
8. O testemunho cristão que compartilhamos é um sinal providencial
de reconciliação e esperança para a sociedade egípcia e suas instituições, uma
semente semeada para frutificar na justiça e na paz. Uma vez que acreditamos
que todos os seres humanos são criados à imagem de Deus, esforcemo-nos por
promover a tranquilidade e a concórdia através duma coexistência pacífica entre
cristãos e muçulmanos, testemunhando assim que Deus deseja a unidade e a harmonia
de toda a família humana e a igual dignidade de cada ser humano. Temos a peito
a prosperidade e o futuro do Egipto. Todos os membros da sociedade têm o
direito e o dever de participar plenamente na vida do país, gozando de plena e
igual cidadania e colaborando para construir a sua nação. A liberdade
religiosa, que engloba a liberdade de consciência e está enraizada na dignidade
da pessoa, é a pedra angular de todas as outras liberdades. É um direito
sagrado e inalienável.
9. Intensifiquemos a nossa oração incessante por todos os
cristãos, no Egipto e em todo o mundo, especialmente no Médio Oriente. Alguns
acontecimentos trágicos e o sangue derramado pelos nossos fiéis, perseguidos e
mortos unicamente pelo motivo de ser cristãos, recordam-nos ainda mais que o
ecumenismo dos mártires nos une e encoraja no caminho da paz e da reconciliação.
Pois, como escreve São Paulo, «se um membro sofre, com ele sofrem todos os membros»
(1 Cor 12, 26).
10. O mistério de Jesus, que morreu e ressuscitou por amor,
situa-se no coração do nosso caminho para a plena unidade. Mais uma vez, os
mártires são os nossos guias. Na Igreja primitiva, o sangue dos mártires foi
semente de novos cristãos; assim também, em nossos dias, o sangue de tantos
mártires seja semente de unidade entre todos os discípulos de Cristo, sinal e
instrumento de comunhão e de paz para o mundo.
11. Obedientes à acção do Espírito Santo, que santifica a Igreja,
a sustenta ao longo dos séculos e conduz àquela unidade plena pela qual Cristo
rezou, hoje nós, Papa Francisco e Papa Tawadros II, para alegrar o coração do
Senhor Jesus, bem como os corações dos nossos filhos e filhas na fé, declaramos
mutuamente que, com uma só mente e um só coração, procuraremos sinceramente não
repetir o Baptismo administrado numa das nossas Igrejas a alguém que deseje
juntar-se à outra. Isto confessamos em obediência às Sagradas Escrituras e à fé
expressa nos três Concílios Ecuménicos reunidos em Niceia, Constantinopla e
Éfeso.
Pedimos a Deus nosso Pai que nos guie, nos tempos e modos que o
Espírito Santo dispuser, para a unidade plena no Corpo místico de Cristo.
12. Concluindo, deixemo-nos guiar pelos ensinamentos e o exemplo
do apóstolo Paulo, que escreve: «[Esforçai-vos] por manter a unidade do
Espírito, mediante o vínculo da paz. Há um só corpo e um só Espírito, assim
como a vossa vocação vos chamou a uma só esperança; um só Senhor, uma só fé, um
só batismo; um só Deus e Pai de todos, que reina sobre todos, age por todos e
permanece em todos» (Ef 4, 3-6).