- na Audiência-Geral, na
Praça de São Pedro – Roma, no dia 24 de Maio
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje gostaria de analisar a experiência
dos dois discípulos de Emaús, sobre a qual fala o Evangelho de Lucas (cf. 24,
13-35). Imaginemos a cena: dois homens caminham desiludidos, tristes, decididos
a deixar para trás a amargura de um vicissitude mal sucedida. Antes daquela
Páscoa estavam cheios de entusiasmo: convencidos de que aqueles dias teriam
sido determinantes para as suas expetativas e para a esperança do povo inteiro.
Jesus, ao qual tinham confiado a própria vida, parecia ter finalmente chegado à
batalha decisiva: agora manifestaria o seu poder, depois de uma longa fase de
preparação e de escondimento. Era isso o que eles esperavam. Mas não foi assim.
Os dois peregrinos cultivavam uma
esperança somente humana, que agora desabava. Aquela cruz erguida no Calvário
era o sinal mais eloquente de uma derrota que não tinham previsto. Se deveras
aquele Jesus era segundo o coração de Deus, deviam chegar à conclusão que Deus
estava inerme, indefeso nas mãos dos violentos, incapaz de opor resistência ao
mal.
Assim, naquela manhã de domingo, os dois
fogem de Jerusalém. Ainda tinham nos olhos os momentos da paixão, a morte de
Jesus; e na alma o pensamento atormentado pelos acontecimentos, durante o
repouso forçado do sábado. Aquela festa de Páscoa, que devia entoar o canto da
libertação, transformou-se pelo contrário no dia mais doloroso da sua vida.
Deixam Jerusalém para ir alhures, a uma aldeia tranquila. Têm toda a aparência
de pessoas empenhadas em apagar uma recordação que magoa. Portanto,
encontram-se numa estrada, andam, tristes. Este cenário — a estrada — já tinha
sido importante nas narrações dos evangelhos; agora tornar-se-á cada vez mais
relevante, no momento em que se começa a narrar a história da Igreja.
O encontro de Jesus com aqueles dois
discípulos parece ser totalmente casual: assemelha-se a uma das numerosas
encruzilhadas que se encontram na vida. Os dois discípulos prosseguem
pensativos e um desconhecido caminha ao lado deles. É Jesus; mas os seus olhos
não são capazes de o reconhecer. E então Jesus começa a sua “terapia da
esperança”. O que acontece nesta estrada é uma terapia da esperança. Quem a
faz? Jesus.
Em primeiro lugar pergunta e escuta: o
nosso Deus não é um Deus intrometido. Embora já conheça o motivo da deceção dos
dois, deixa-lhes o tempo para poder sondar profundamente a amargura que se
apoderou deles. Daqui surge uma confissão que é um refrão da existência humana:
«Nós esperávamos, mas... Nós esperávamos, mas...» (v. 21). Quantas tristezas, quantas
derrotas, quantas falências há na vida de cada pessoa! No fundo somos todos um
pouco como esses dois discípulos. Quantas vezes na vida esperamos, quantas
vezes nos sentimos a um passo da felicidade e, no fim, ficamos desiludidos. Mas
Jesus caminha com todas as pessoas desanimadas que procedem cabisbaixas. E
caminhando com elas, de forma discreta, consegue restituir-lhes a esperança.
Jesus fala com eles sobretudo através das
Escrituras. Quem pega o livro de Deus nas mãos não se cruza com histórias de fácil
heroísmo, campanhas de conquista impetuosas. A verdadeira esperança nunca é
pouco dispendiosa: passa sempre através das derrotas. A esperança de quem não
sofre, talvez nem sequer seja tal. Deus não gosta de ser amado como poderíamos
amar um general que leva o seu povo à vitória, aniquilando no sangue os seus
adversários. O nosso Deus é uma chama esmorecida que arde num dia de frio e de
vento, e não obstante a sua presença neste mundo possa parecer frágil, Ele
escolheu o lugar que todos nós desdenhamos.
Em seguida Jesus repete também aos dois
discípulos o gesto fulcral de cada Eucaristia: pegou no pão, abençoou-o e,
depois de o partir, ofereceu-o. Nesta sequência de gestos, não há porventura
toda a história de Jesus? E não há, em cada Eucaristia, também o sinal do que
deve ser a Igreja? Jesus pega em nós, abençoa-nos, “parte” a nossa vida —
porque não há amor sem sacrifício — e oferece-a aos outros, oferece-a a todos.
O encontro de Jesus com os dois discípulos
de Emaús é rápido. Todavia, nele está todo o destino da Igreja. Narra-nos que a
comunidade cristã não está fechada numa cidadela fortificada, mas caminha no
seu ambiente mais vital, ou seja, a estrada. E ali encontra as pessoas com as
suas esperanças e as suas desilusões, por vezes pesadas. A Igreja escuta as
histórias de todos, assim como sobressaem do íntimo da consciência pessoal;
para depois oferecer a Palavra de vida, o testemunho de amor, amor fiel até ao
fim. E então o coração das pessoas volta a arder de esperança.
Todos nós, na nossa vida, tivemos momentos
difíceis, obscuros; momentos nos quais caminhávamos tristes, pensativos, sem
horizontes, somente com um muro à nossa frente. E Jesus sempre está ao nosso
lado para nos dar esperança, para nos aquecer o coração e dizer: “Vai em
frente, estou contigo. Vai em frente”. O segredo da estrada que conduz a Emaús
resume-se inteiramente nisto: mesmo através das aparências contrárias,
continuamos a ser amados, e Deus nunca deixará de nos querer bem. Deus
caminhará sempre connosco, sempre, até nos momentos mais dolorosos, nos
períodos mais difíceis, também nos momentos de derrota: ali está o Senhor. E
esta é a nossa esperança. Vamos em frente com esta esperança! Porque Ele está
ao nosso lado e caminha connosco, sempre! (cf. Santa Sé)