PALAVRA COM SENTIDO

PALAVRA COM SENTIDO “… O Senhor esteve a meu lado e deu-me força…” (cf. II Timóteo 4, 17) A segunda leitura da Liturgia do dia apresenta-nos a exortação de São Paulo a Timóteo, seu colaborador e filho dileto, na qual reconsidera a própria existência de apóstolo totalmente consagrado à missão (cf. 2 Tm 4, 6-8.16-18). Vendo já próximo o fim do seu caminho terreno, descreve-o com referência a três estações: o presente, o passado, o futuro. O presente, interpreta-o com a metáfora do sacrifício: «a hora já chegou de eu ser sacrificado» (v. 6). No respeitante ao passado, Paulo indica a sua vida passada com as imagens do «bom combate» e da «corrida» de um homem que foi coerente com os próprios compromissos e responsabilidades (cf. v. 7); por conseguinte, para o futuro confia no reconhecimento por parte de Deus, que é «juiz justo» (v. 8). Mas a missão de Paulo só resultou eficaz, justa e fiel graças à proximidade e à força do Senhor, que fez dele um anunciador do Evangelho a todos os povos. Eis a sua expressão: «Mas o Senhor assistiu-me e fortaleceu-me, para que, por mim, fosse cumprida a pregação e todos os gentios a ouvissem» (v. 17). Nesta narração autobiográfica de São Paulo reflecte-se a Igreja (…) Em Paulo, a comunidade cristã encontra o seu modelo, na convicção de que é a presença do Senhor que torna eficaz o trabalho apostólico e a obra de evangelização. A experiência do Apóstolo dos gentios recorda-nos que nos devemos comprometer nas actividades pastorais e missionárias, por um lado, como se o resultado dependesse dos nossos esforços, com o espírito de sacrifício do atleta que não pára, nem sequer diante das derrotas; mas por outro lado, sabendo que o verdadeiro sucesso da nossa missão é dom da Graça: é o Espírito Santo que torna eficaz a missão da Igreja no mundo. Hoje, é tempo de missão e de coragem! Coragem para reforçar os passos vacilantes; de retomar o gosto de se consumir pelo Evangelho; de readquirir confiança na força que a missão tem em si. É tempo de coragem, mesmo se ter coragem não significa ter garantia de um sucesso. É-nos pedida a coragem para lutar, não necessariamente para vencer; para anunciar, não necessariamente para converter. É-nos pedida a coragem de sermos alternativos no mundo, sem contudo jamais sermos polémicos ou agressivos. É-nos pedida a coragem de nos abrirmos a todos, sem nunca diminuir o absoluto e a unicidade de Cristo, único salvador de todos. É-nos pedida a coragem para resistir à incredulidade, sem nos tornarmos arrogantes. É-nos pedida também a coragem do publicano do Evangelho de hoje, que, com humildade, nem sequer ousava erguer os olhos ao céu, mas batia a mão no peito dizendo: «Ó Deus, tem piedade de mim, que sou pecador». Hoje é tempo de coragem! Hoje é necessária coragem! A Virgem Maria, modelo da Igreja «em saída» e dócil ao Espírito Santo, nos ajude a sermos todos, em virtude do nosso Baptismo, discípulos missionários para levar a mensagem da salvação à inteira família humana. (cf. Papa Francisco, na Oração do Angelus, Praça de São Pedro, Roma, Domingo, 23 de Outubro de 2016)

segunda-feira, 26 de junho de 2017

PALAVRA DO PAPA FRANCISCO


- na Audiência-Geral, na Praça de São Pedro – Roma, no dia 21 de Junho

No dia do nosso Baptismo, ressoou para nós a invocação dos santos. Naquele momento, muitos de nós éramos crianças, levadas ao colo pelos nossos pais. Pouco antes de fazer a unção com o Óleo dos catecúmenos, símbolo da força de Deus na luta contra o mal, o sacerdote convidou toda a assembleia a rezar por aqueles que estavam prestes a receber o Baptismo, invocando a intercessão dos santos. Era a primeira vez que, durante a nossa vida, nos concediam esta companhia de irmãos e irmãs “mais velhos” — os santos — que passaram pelo mesmo caminho que nós passamos; que conheceram as mesmas dificuldades que nós conhecemos; e vivem, para sempre, no abraço de Deus. A Carta aos Hebreus define esta companhia que nos circunda, com a expressão «multidão de testemunhas» (12, 1). Assim são os santos: uma multidão de testemunhas.
Na luta contra o mal, os cristãos não desesperam. O cristianismo cultiva uma confiança incurável: não acredita que as forças negativas e desagregadoras possam predominar. A última palavra sobre a história do homem não é o ódio, não é a morte, não é a guerra. Em cada momento da vida, somos ajudados pela mão de Deus, e também pela presença discreta de todos os crentes que «nos precederam com o sinal da fé» (Cânone Romano). A sua existência diz-nos, antes de tudo, que a vida cristã não é um ideal inacessível. E, ao mesmo tempo, conforta-nos: não estamos sozinhos, a Igreja é composta por inúmeros irmãos, muitas vezes anónimos, que nos precederam e que, mediante a acção do Espírito Santo, participam nas vicissitudes de quantos ainda vivem aqui na terra.
A do Baptismo não é a única invocação dos santos que marca o caminho da vida cristã. Quando dois noivos consagram o seu amor no sacramento do Matrimónio, invoca-se de novo para eles — desta vez como casal — a intercessão dos santos. E esta invocação é fonte de confiança para os dois jovens que partem para a “viagem” da vida conjugal. Quem ama verdadeiramente tem o desejo e a coragem de dizer “para sempre” — “para sempre” — mas sabe que tem a necessidade da graça de Cristo e da ajuda dos santos para poder levar a vida matrimonial para sempre. Não como alguns dizem: “enquanto o amor durar”. Não: para sempre! Caso contrário, é melhor que não te cases. Ou para sempre ou nada. Por isso, na liturgia nupcial invoca-se a presença dos santos. E, nos momentos difíceis, é preciso ter a coragem de elevar o olhar para o céu, pensando nos numerosos cristãos que passaram através das tribulações e conservaram brancas as suas vestes baptismais, lavando-as no sangue do Cordeiro (cf. Ap 7, 14): assim reza o Livro do Apocalipse. Deus nunca nos abandona: cada vez que tivermos necessidade, virá um dos seus anjos para nos animar e para nos infundir a consolação. “Anjos” às vezes com um rosto e um coração humanos, porque os santos de Deus estão sempre aqui, escondidos no meio de nós. Isto é difícil de entender e até de imaginar, mas os santos estão presentes na nossa vida. E quando alguém invoca um santo ou uma santa, é precisamente porque se encontra próximo de nós.
Inclusive os presbíteros conservam a recordação de uma invocação dos santos, pronunciada sobre eles. É um dos momentos mais emocionantes da liturgia da ordenação. Os candidatos deitam-se no chão, com o rosto virado para baixo. E toda a assembleia, presidida pelo Bispo, invoca a intercessão dos santos. Um homem ficaria esmagado sob o peso da missão que lhe é confiada, mas ouvindo que o Paraíso inteiro o protege, que a graça de Deus não faltará porque Jesus permanece sempre fiel, então ele pode partir sereno e encorajado. Não estamos sozinhos.
E o que somos nós? Somos pó que aspira ao céu. Frágeis nas nossas forças, mas é poderoso o mistério da graça que está presente na vida dos cristãos. Somos fiéis a esta terra, que Jesus amou em cada instante da sua vida, mas sabemos e queremos esperar na transfiguração do mundo, no seu cumprimento definitivo onde, finalmente, já não haverá lágrimas, maldade, sofrimento.
Que o Senhor conceda a todos nós a esperança de ser santos. Mas alguns de vós poderão perguntar-me: “Padre, é possível ser santo na vida de todos os dias?”. Sim, é possível. “Mas isto significa que devemos rezar o dia inteiro?” Não, quer dizer que tu deves cumprir o teu dever ao longo do dia: rezar, ir ao trabalho, proteger os teus filhos. Mas é preciso fazer tudo com o coração aberto a Deus, de modo que o trabalho, até na enfermidade e no sofrimento, inclusive no meio das dificuldades, permaneça aberto a Deus. E assim é possível ser santo. Que o Senhor nos dê a esperança de ser santos. Não pensemos que é algo difícil, que é mais fácil sermos delinquentes do que santos! Não. Podemos ser santos, porque o Senhor nos ajuda; é Ele que nos assiste.
É o grande presente que cada um de nós pode oferecer ao mundo. Que o Senhor nos conceda a graça de crer tão profundamente n’Ele, a ponto de nos tornarmos imagem de Cristo para este mundo. A nossa história tem necessidade de “místicos”: de pessoas que rejeitam qualquer domínio, que aspiram à caridade e à fraternidade. Homens e mulheres que vivem, aceitando até um quinhão de sofrimento, porque assumem o cansaço do próximo. Mas, sem estes homens e mulheres, o mundo não teria esperança. Por isso, faço votos a fim de que vós — e também eu — recebamos do Senhor o dom da esperança de sermos santos. Obrigado! (cf. Santa Sé)