- homilia do Papa, na Praça
de São Pedro – Roma, no dia 29 de Junho, solenidade de São Pedro e São Paulo,
na Santa Missa e Bênção dos Pálios dos novos Arcebispos Metropolitanos.
“A liturgia de hoje oferece-nos três
palavras que são essenciais para a vida do apóstolo: confissão, perseguição,
oração.
A confissão é a que ouvimos dos lábios de
Pedro no Evangelho, quando a pergunta do Senhor, de geral, passa a particular.
Com efeito, Jesus, primeiro, pergunta: «Quem dizem os homens que é o Filho do
Homem?» (Mt 16, 13). Desta «sondagem» resulta, de vários lados, que o povo
considera Jesus um profeta. E, então, o Mestre coloca aos discípulos a pergunta
verdadeiramente decisiva: «E vós, quem dizeis que Eu sou?» (16, 15). Agora,
responde apenas Pedro: «Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo» (16, 16). Esta é
a confissão: reconhecer em Jesus o Messias esperado, o Deus vivo, o Senhor da
nossa própria vida.
Hoje, Jesus dirige esta pergunta vital a
nós, a todos nós e, de modo particular, a nós Pastores. É a pergunta decisiva,
face à qual não valem respostas de circunstância, porque está em jogo a vida: e
a pergunta da vida pede uma resposta de vida. Pois, de pouco serve conhecer os
artigos da fé, se não se confessa Jesus como Senhor da nossa própria vida. Hoje,
Ele fixa-nos nos olhos e pergunta: «Quem sou Eu para ti?» Como se dissesse:
«Sou ainda Eu o Senhor da tua vida, a direcção do teu coração, a razão da tua
esperança, a tua confiança inabalável?» Com São Pedro, também nós renovamos
hoje a nossa opção de vida como discípulos e apóstolos; passamos novamente da
primeira à segunda pergunta de Jesus, para sermos «seus» não só por palavras,
mas com os factos e a vida.
Perguntemo-nos se somos cristãos de
parlatório, que conversamos sobre como andam as coisas na Igreja e no mundo, ou
apóstolos em caminho, que confessam Jesus com a vida, porque O têm no coração.
Quem confessa Jesus, sabe que está obrigado não apenas a dar conselhos, mas a
dar a vida; sabe que não pode crer de maneira tíbia, mas é chamado a «abrasar»
por amor; sabe que, na vida, não pode «flutuar» ou reclinar-se no bem-estar,
mas deve arriscar fazendo-se ao largo, apostando, dia-a-dia, com o dom de si
mesmo. Quem confessa Jesus, faz como Pedro e Paulo: segue-O até ao fim; não até
um certo ponto, mas até ao fim, e segue-O pelo seu caminho, não pelos nossos
caminhos. O seu caminho é o caminho da vida nova, da alegria e da ressurreição,
o caminho que passa também através da cruz e das perseguições.
E aqui temos a segunda palavra:
perseguições. Não foram só Pedro e Paulo que deram o sangue por Cristo, mas,
nos primeiros tempos, toda a comunidade foi perseguida, como nos recordou o
livro dos Actos dos Apóstolos (cf. 12, 1). Também hoje, em várias partes do
mundo, por vezes num clima de silêncio – e, não raro, um silêncio cúmplice –,
muitos cristãos são marginalizados, caluniados, discriminados, vítimas de
violências mesmo mortais, e não raro sem o devido empenho de quem poderia fazer
respeitar os seus direitos sagrados.
Entretanto queria salientar sobretudo
aquilo que o apóstolo Paulo afirma antes: «estou pronto – escreve ele – para
oferecer-me como sacrifício» (2 Tim 4, 6). Para ele, viver era Cristo (cf. Flp.
1, 21), e Cristo crucificado (cf. 1 Cor 2, 2), que deu a vida por ele (cf. Gal
2, 20). E, assim, Paulo, como discípulo fiel, seguiu o Mestre, oferecendo
também ele a vida. Sem a cruz, não há Cristo; mas, sem a cruz, não há sequer o
cristão. De facto, «é próprio da virtude cristã não só fazer o bem, mas também
saber suportar os males» (Agostinho, Sermão 46, 13), como Jesus. Suportar o mal
não é só ter paciência e prosseguir com resignação; suportar é imitar Jesus: é
carregar o peso, levá-lo aos ombros por amor d’Ele e dos outros. É aceitar a
cruz, prosseguindo confiadamente porque não estamos sozinhos: o Senhor
crucificado e ressuscitado está connosco. Deste modo podemos dizer, com Paulo,
que «em tudo somos atribulados, mas não esmagados; confundidos, mas não
desesperados; perseguidos, mas não abandonados» (2 Cor 4, 8-9).
Suportar é saber vencer com Jesus e à
maneira de Jesus, não à maneira do mundo. É por isso que Paulo se considera –
como ouvimos – um vencedor que está prestes a receber a coroa (cf. 2 Tim 4, 8),
escrevendo: «Combati o bom combate, terminei a corrida, conservei a fé» (4, 7).
A única conduta do seu bom combate foi viver para: não para si próprio, mas
para Jesus e para os outros. Viveu «correndo», isto é, sem se poupar, antes
pelo contrário consumando-se. Há uma coisa que ele diz que conservou: não a
saúde, mas a fé, isto é, a confissão de Cristo. Por amor d’Ele viveu as
provações, as humilhações e os sofrimentos, que nunca se devem procurar, mas
aceitar. E assim, no mistério do sofrimento oferecido por amor, neste mistério
que muitos irmãos perseguidos, pobres e doentes encarnam também, hoje,
resplandece a força salvífica da cruz de Jesus.
A terceira palavra é oração. A vida do
apóstolo, que brota da confissão e desagua na oferta, flui, dia-a-dia, na
oração. A oração é a água indispensável que alimenta a esperança e faz crescer
a confiança. A oração faz-nos sentir amados, e permite-nos amar. Faz-nos
avançar nos momentos escuros, porque acende a luz de Deus. Na Igreja, é a
oração que nos sustenta a todos e nos faz superar as provações. Vemo-lo na
primeira Leitura: «Enquanto Pedro estava encerrado na prisão, a Igreja orava a
Deus, instantemente, por ele» (Act 12, 5). Uma Igreja que ora é guardada pelo
Senhor e caminha na companhia d’Ele. Orar é entregar-Lhe o caminho, para que o
tome ao seu cuidado. A oração é a força que nos une e sustenta, o remédio
contra o isolamento e a autossuficiência que levam à morte espiritual. Com
efeito, o Espírito de vida não sopra, se não se reza; e, sem a oração, não se
abrem as prisões interiores que nos mantêm prisioneiros.
Que os Santos Apóstolos nos obtenham um
coração como o deles, fatigado e pacificado pela oração: fatigado, porque pede,
bate à porta e intercede, carregado com tantas pessoas e situações que deve
confiar a Deus; mas, ao mesmo tempo, pacificado, porque o Espírito traz
consolação e fortaleza quando se ora. Como é urgente haver, na Igreja, mestres
de oração, mas antes de tudo homens e mulheres de oração, que vivem a oração!...”
(cf. Santa Sé)