- na Audiência-Geral, no dia 23 de Agosto, na Praça de São
Pedro – Roma
Bom dia, prezados
irmãos e irmãs!
Ouvimos a Palavra
de Deus no livro do Apocalipse: «Eis que eu renovo todas as coisas» (21, 5). A
esperança crisã baseia-se na fé em Deus que cria sempre novidades na vida do
homem, cria novidades na história, cria novidades no cosmos. O nosso Deus é o
Deus que cria novidades, porque é o Deus das surpresas.
Não é cristão
caminhar cabisbaixo — como os porcos: eles caminham sempre assim — sem erguer
os olhos rumo ao horizonte. Como se todo o nosso caminho acabasse aqui, no arco
de poucos metros de viagem; como se na nossa vida não houvesse meta alguma,
nenhum ponto de chegada, como se nós fôssemos obrigados a um perambular eterno,
sem qualquer razão para todos os nossos cansaços. Isto não é cristão.
As páginas finais
da Bíblia mostram-nos o derradeiro horizonte do caminho do crente: a Jerusalém
do Céu, a Jerusalém celeste. Ela é imaginada antes de tudo como um imenso
tabernáculo, onde Deus acolherá todos os homens para habitar definitivamente
com eles (cf. Ap 21, 3). Esta é a nossa esperança. E o que fará Deus quando,
finalmente, estivermos com Ele? Terá uma ternura infinita por nós, como um pai
ao receber os seus filhos que se cansaram e sofreram prolongadamente. No
Apocalipse, João profetiza: «Eis aqui o tabernáculo de Deus com os homens!
[...Ele] enxugará todas as lágrimas de seus olhos e já não haverá morte, nem
luto, nem grito, nem dor, porque passou a primeira condição [...] Eis que eu
renovo todas as coisas!» (21, 3-5). O Deus na novidade!
Procurai meditar
sobre este trecho da Sagrada Escritura, não de maneira abstrata, mas depois de
ter lido uma crónica dos nossos dias, depois de ter visto o telejornal ou a
primeira página dos jornais, onde há muitas tragédias, onde se anunciam
notícias tristes às quais todos nós corremos o risco de nos habituarmos. Saudei
algumas pessoas de Barcelona: quantas notícias tristes vêm dali! Saudei algumas
pessoas do Congo, e quantas notícias tristes chegam de lá! E muitas outras!
Para mencionar apenas dois países, de vós que estais aqui... Procurai pensar no
rosto das crianças apavoradas pela guerra, no pranto das mães, nos sonhos
interrompidos de tantos jovens, nos refugiados que enfrentam viagens terríveis
e muitas vezes são explorados... Infelizmente, a vida é também isto. Por vezes
diríamos que é sobretudo isto.
Talvez. Mas há um
Pai que chora connosco; existe um Pai que verte lágrimas de piedade infinita
pelos seus filhos. Temos um Pai que sabe chorar, que chora connosco. Um Pai que
nos espera para nos consolar, porque conhece os nossos sofrimentos e preparou
para nós um futuro diverso. Esta é a grandiosa visão da esperança cristã, que
se dilata ao longo de todos os dias da nossa existência e deseja consolar-nos.
Deus não quis a
nossa vida por engano, obrigando-se a si mesmo e a nós a duras noites de
angústia. Ao contrário, criou-nos porque nos quer felizes. É o nosso Pai, e se
nós aqui e agora experimentamos uma vida diversa daquela que Ele desejou para
nós, Jesus garante-nos que o próprio Deus realiza o seu resgate. Ele trabalha
para nos resgatar.
Acreditamos e
sabemos que a morte e o ódio não são as últimas palavras pronunciadas sobre a
parábola da existência humana. Ser cristão implica uma nova perspetiva: um
olhar cheio de esperança. Alguns julgam que a vida encerra todas as suas
felicidades na juventude e no passado, e que o viver é uma lenta decadência.
Outros ainda acham que as nossas alegrias são apenas episódicas e passageiras,
e que na vida dos homens está inscrita a insensatez. Há aqueles que, diante de
tantas calamidades, dizem: “Mas a vida não tem sentido. O nosso caminho é a
insensatez”. Mas nós cristão não acreditamos nisto. Ao contrário, cremos que no
horizonte do homem existe um sol que ilumina para sempre. Acreditamos que os
nossos dias mais bonitos ainda devem chegar. Somos pessoas mais de primavera do
que de outono. Gostaria de perguntar agora — cada qual responda no seu coração,
em silêncio, mas responda — “Sou um homem, uma mulher, um jovem, uma jovem de
primavera ou de outono? A minha alma está na primavera ou no outono?”. Cada um
responda a si mesmo. Vislumbramos os rebentos de um mundo novo, em vez de
folhas amareladas nos ramos. Não nos embalemos em nostalgias, arrependimentos e
lamentações: sabemos que Deus nos quer herdeiros de uma promessa e incansáveis
cultivadores de sonhos. Não vos esqueçais daquela pergunta: “Sou uma pessoa de
primavera ou de outono?”. De primavera, que espera a flor, que aguarda o fruto,
que se põe à espera do sol que é Jesus, ou de outono, sempre cabisbaixo,
amargurado e, como às vezes eu disse, com a cara de pimenta avinagrada.
O cristão sabe que
o Reino de Deus, o seu Senhorio de amor continua a crescer como um grande campo
de trigo, não obstante no meio haja o joio. Há sempre problemas, bisbilhotices,
guerras, enfermidades... existem problemáticas. Mas o trigo cresce, e no final
o mal será eliminado. O futuro não nos pertence, mas sabemos que Jesus Cristo é
a maior graça da vida: é o abraço de Deus que nos espera no fim, mas que já
agora nos acompanha e nos consola ao longo do caminho. Ele leva-nos ao grande
“tabernáculo” de Deus com os homens (cf. Ap 21, 3), com muitos outros irmãos e
irmãs, levaremos a Deus a recordação dos dias vividos aqui na terra. E naquele
instante será bom descobrir que nada se perdeu, nenhum sorriso e nenhuma
lágrima. Por mais longa que a nossa vida tiver sido, teremos a impressão de ter
vivido num sopro. E que a criação não acabou no sexto dia do Génesis, mas
continuou sem se cansar, porque Deus sempre se preocupou connosco. Até ao dia
em que tudo se completar, na manhã em que se extinguirem as lágrimas, no
próprio instante em que Deus pronunciar a sua última palavra de bênção: «Eis —
diz o Senhor — que eu renovo todas as coisas!» (v. 5). Sim, o nosso Pai é o
Deus das novidades e das suspresas. E naquele dia nós seremos verdadeiramente
felizes, e choraremos. Sim, mas choraremos de alegria! (cf. Santa Sé)