- na homilia da Solenidade da Epifania do Senhor, na Basílica
de São Pedro , Roma no dia 6 de Janeiro
O nosso percurso ao encontro do Senhor, que hoje Se manifesta como
luz e salvação para todos os povos, é elucidado por três gestos dos Magos.
Estes vêem a estrela, põem-se a caminho e oferecem presentes.
Ver a estrela. É o ponto de partida. Mas, poder-nos-íamos perguntar: Por que
foi que só os Magos viram a estrela? Porque talvez poucos levantaram o olhar
para o céu. De facto na vida, muitas vezes, contentamo-nos com olhar para a
terra: basta a saúde, algum dinheiro e um pouco de divertimento. E pergunto-me:
Sabemos nós ainda levantar os olhos para o céu? Sabemos sonhar, anelar por
Deus, esperar a sua novidade, ou deixamo-nos levar pela vida como um ramo seco
pelo vento? Os Magos não se contentaram com deixar correr, flutuando. Intuíram
que, para viver de verdade, é preciso uma meta alta e, por isso, é preciso
manter alto o olhar.
E poder-nos-íamos perguntar ainda: Porque é que muitos outros,
dentre aqueles que levantavam o olhar para o céu, não seguiram aquela estrela,
«a sua estrela» (Mt 2, 2)? Talvez porque não era uma estrela deslumbrante, que
brilhasse mais do que as outras. Era uma estrela que os Magos viram – diz o
Evangelho – «despontar» (cf. Mt 2, 2.9). A estrela de Jesus não encandeia, não
atordoa, mas gentilmente convida. Podemos perguntar-nos pela estrela que
escolhemos na vida. Há estrelas deslumbrantes, que suscitam fortes emoções mas
não indicam o caminho. Tal é o sucesso, o dinheiro, a carreira, as honras, os
prazeres procurados como objectivo da existência. Não passam de meteoritos:
brilham por um pouco, mas depressa caem e o seu esplendor desaparece. São
estrelas cadentes, que, em vez de orientar, despistam. Ao contrário, a estrela
do Senhor nem sempre é fulgurante, mas está sempre presente: é meiga, guia-te
pela mão na vida, acompanha-te. Não promete recompensas materiais, mas garante
a paz e dá, como aos Magos, uma «imensa alegria» (Mt 2, 10). Pede, porém, para
caminhar.
Caminhar,
a segunda acção dos Magos, é essencial para encontrar Jesus. De facto, a sua
estrela solicita a decisão de se pôr a caminho, a fadiga diária da caminhada;
pede à pessoa para se libertar de pesos inúteis e sumptuosidades embaraçantes,
que estorvam, e aceitar os imprevistos que não aparecem assinalados no mapa da
vida tranquila. Jesus deixa-Se encontrar por quem O busca, mas, para O buscar,
é preciso mover-se, sair. Não ficar à espera; arriscar. Não ficar parados;
avançar. Jesus é exigente: a quem O busca, propõe-lhe deixar as poltronas das
comodidades mundanas e os torpores sonolentos das suas lareiras. Seguir a Jesus
não é um polido protocolo a respeitar, mas um êxodo a viver. Deus, que libertou
o seu povo mediante o trajecto do êxodo e chamou novos povos para seguir a sua
estrela, dá a liberdade e distribui a alegria, sempre e só, em caminho. Por
outras palavras, para encontrar Jesus, é preciso perder o medo de entrar em
jogo, a satisfação do caminho andado, a preguiça de não pedir mais nada à vida.
Simplesmente para encontrar o Menino, já é preciso arriscar; mas vale bem a
pena, porque, ao encontrar aquele Menino, ao descobrir a sua ternura e o seu
amor, encontramo-nos a nós mesmos.
Pôr-se a caminho não é fácil. Assim no-lo mostra o Evangelho
através dos vários personagens. Temos Herodes, perturbado pelo temor de que o
nascimento dum rei ameace o seu poder. Por isso, organiza reuniões e envia
outros a recolher informações; mas ele não se move, está fechado no seu
palácio. E, com ele, «toda a Jerusalém» (Mt 2, 3) tem medo: medo das coisas
novas de Deus. Prefere que tudo permaneça como antes – «fez-se sempre assim» -,
e ninguém tem a coragem de se pôr a caminho. Mais subtil é a tentação dos
sacerdotes e escribas: conhecem o lugar exacto e indicam-no a Herodes, citando
inclusive a profecia antiga; sabem, mas não dão um passo rumo a Belém. Pode ser
a tentação de quem é crente há muito tempo: discorre-se de fé, como de algo que
já é conhecido, mas que não se compromete pessoalmente com o Senhor. Fala-se,
mas não se reza; lastima-se, mas não se faz o bem. Pelo contrário, os Magos
falam pouco e caminham muito. Embora ignorando as verdades da fé, estão
ansiosos e põem-se a caminho, como evidenciam os verbos do Evangelho: «viemos
adorá-lo» (Mt 2, 2), «puseram-se a caminho; entraram na casa; prostraram-se;
regressaram» (cf. Mt 2, 9.11.12): sempre em movimento.
Oferecer.
Quando chegaram ao pé de Jesus, depois da longa viagem, os Magos fazem como
Ele: dão. Jesus está ali para oferecer a vida; eles oferecem as suas
preciosidades: ouro, incenso e mirra. O Evangelho está cumprido, quando o
caminho da vida chega à doação. Dar gratuitamente, por amor do Senhor, sem
esperar nada em troca: isto é sinal certo de ter encontrado Jesus, que diz
«recebestes de graça, dai de graça» (Mt 10, 8). Praticar o bem sem cálculos,
mesmo se ninguém no-lo pede, mesmo se não nos faz ganhar nada, mesmo se não nos
apetece. Isto é o que Deus deseja. Ele, que Se fez pequenino por nós, pede-nos
para oferecermos algo pelos seus irmãos mais pequeninos. E quem são? São
precisamente aqueles que não têm com que retribuir, como o necessitado, o
faminto, o forasteiro, o preso, o pobre (cf. Mt 25, 31-46). Oferecer um
presente agradável a Jesus é cuidar dum doente, dedicar tempo a uma pessoa
difícil, ajudar alguém que não nos inspira, oferecer o perdão a quem nos
ofendeu. São presentes gratuitos, não podem faltar na vida cristã; caso
contrário, como nos recorda Jesus, amando apenas aqueles que nos amam, fazemos
como os pagãos (Mt 5, 46-47). Olhemos as nossas mãos, muitas vezes vazias de
amor, e procuremos, hoje, pensar num presente gratuito, sem retribuição, que
possamos oferecer. Será agradável ao Senhor. E peçamos-Lhe: «Senhor, fazei-me
redescobrir a alegria de dar».
Amados irmãos e irmãs, façamos como os Magos: olhar para o Alto,
caminhar e oferecer presentes gratuitamente.
(cf. Santa Sé)