- na homilia da Santa Missa
com os membros dos Institutos de Vida Consagrada e das Sociedades de Vida
Apostólica, no XXII Dia Mundial da Vida Consagrada, Basílica de São Pedro,
Vaticano - Roma, no dia 2 de Fevereiro
Quarenta
dias depois do Natal, celebramos o Senhor que, entrando no templo, vem ao
encontro do seu povo. No Oriente cristão, esta festa é chamada precisamente
«Festa do Encontro»: é o encontro entre o Deus Menino, que traz vida nova, e a
humanidade à sua espera, representada pelos anciãos no templo.
No
templo, verifica-se ainda outro encontro: o encontro entre dois pares humanos,
ou seja, os jovens Maria e José, por um lado, e os anciãos Simeão e Ana, por outro.
Os anciãos recebem dos jovens, os jovens aprendem dos anciãos. Com efeito, no
templo, Maria e José encontram as raízes do povo, o que é importante, pois a
promessa de Deus não se realiza individualmente e duma vez só, mas
conjuntamente e ao longo da história. E encontram também as raízes da fé,
porque a fé não é uma noção que se deve aprender num livro, mas a arte de viver
com Deus, que se recebe da experiência de quem nos precedeu no caminho. Assim,
encontrando os anciãos, os dois jovens encontram-se a si mesmos. E os dois
anciãos, caminhando já para o fim dos seus dias, recebem Jesus, sentido da sua
vida. Assim, este episódio cumpre a profecia de Joel: «Os vossos anciãos terão
sonhos, e os vossos jovens terão visões» (3, 1). Naquele encontro, os jovens
veem a sua missão e os anciãos realizam os seus sonhos; e tudo isto porque, no
centro do encontro, está Jesus.
Olhemos
o nosso caso, amados irmãos e irmãs consagrados! Tudo começou pelo encontro com
o Senhor. Dum encontro e duma chamada, nasceu o caminho de consagração. É
preciso recordá-lo. E, se nos recordarmos bem, veremos que, naquele encontro,
não estávamos sozinhos com Jesus: estava também o povo de Deus, a Igreja,
jovens e anciãos, como no Evangelho. Neste, há um detalhe interessante:
enquanto os jovens Maria e José observam fielmente as prescrições da Lei – o
Evangelho repete-o quatro vezes – e nunca falam, os anciãos Simeão e Ana
acorrem e profetizam. Parece que devia ser o contrário! Geralmente são os
jovens que falam com entusiasmo do futuro, enquanto os anciãos guardam o
passado. No Evangelho, sucede o contrário, porque, quando nos encontramos no
Senhor, chegam pontualmente as surpresas de Deus. Para permitir que as mesmas
aconteçam na vida consagrada, convém lembrar-nos que não se pode renovar o
encontro com o Senhor sem o outro: nunca o deixeis para trás; nunca façais
descartes geracionais; mas, diariamente, caminhai lado a lado, com o Senhor no
centro. Porque, se os jovens são chamados a abrir novas portas, os anciãos têm
as chaves. E a juventude dum instituto [de vida consagrada] encontra-se indo às
raízes, ouvindo as pessoas anciãs. Não há futuro sem este encontro entre
anciãos e jovens; não há crescimento sem raízes, e não há florescimento sem
novos rebentos. Jamais profecia sem memória; jamais memória sem profecia; mas
que sempre se encontrem!
A
vida agitada de hoje induz-nos a fechar muitas portas ao encontro e, com
frequência, por medo do outro. As portas dos centros comerciais e as conexões
de rede estão sempre abertas. Mas, na vida consagrada, não deve ser assim: o
irmão e a irmã que Deus me dá são parte da minha história, são presentes que
devo guardar. Que não nos aconteça olhar mais para o ecrã do telemóvel do que
para os olhos do irmão, ou fixarmo-nos mais nos nossos programas do que no
Senhor. Com efeito, quando se colocam no centro os projectos, as técnicas e as
estruturas, a vida consagrada deixa de atrair e comunicar-se a outros; não
floresce, porque esquece «aquilo que tem debaixo da terra», isto é, as raízes.
A
vida consagrada nasce e renasce do encontro com Jesus assim como é: pobre,
casto e obediente. A linha sobre a qual caminha é dupla: por um lado, a amorosa
iniciativa de Deus, da qual tudo começa e à qual sempre devemos retornar; e,
por outro, a nossa resposta, que é de amor verdadeiro quando não há «se» nem
«mas»; quando imita Jesus pobre, casto e obediente. Deste modo, enquanto a vida
do mundo procura acumular, a vida consagrada deixa as riquezas que passam, para
abraçar Aquele que permanece. A vida do mundo corre atrás dos prazeres e ambições
pessoais; a vida consagrada deixa o afecto livre de qualquer propriedade para
amar plenamente a Deus e aos outros. A vida do mundo aposta em poder fazer o
que se quer; a vida consagrada escolhe a obediência humilde como liberdade maior.
E, enquanto a vida do mundo depressa deixa vazias as mãos e o coração, a vida
segundo Jesus enche de paz até ao fim, como no Evangelho, onde os anciãos
chegam felizes ao ocaso da vida, com o Senhor nos seus braços e a alegria no
coração.
Como
nos faz bem ter o Senhor «nos braços» (Lc 2, 28), à semelhança de Simeão! Não
só na mente e no coração, mas também nas mãos, ou seja, em tudo o que fazemos:
na oração, no trabalho, à mesa, ao telefone, na escola, com os pobres, por todo
o lado. Ter o Senhor nas mãos é o antídoto contra o misticismo isolado e o activismo
desenfreado, porque o encontro real com Jesus endireita tanto os
sentimentalistas devotos como os activistas frenéticos. Viver o encontro com
Jesus é o remédio também contra a paralisia da normalidade, abrindo-se ao
rebuliço diário da graça. Deixar-se encontrar por Jesus, fazer encontrar Jesus:
é o segredo para manter viva a chama da vida espiritual. É o modo para não ser
absorvido numa vida asfixiadora, onde prevalecem as queixas, a amargura e as
inevitáveis decepções. Encontrar-se em Jesus como irmãos e irmãs, jovens e
anciãos, para superar a retórica estéril dos «bons velhos tempos» – aquela nostalgia
que mata a alma –, para silenciar o «aqui nada funciona». O coração, se
encontrar cada dia Jesus e os seus irmãos, não se polariza para o passado nem
para o futuro, mas vive o «hoje» de Deus, em paz com todos.
No
final dos Evangelhos, há outro encontro com Jesus que pode inspirar a vida
consagrada: o das mulheres no sepulcro. Foram para encontrar um morto, o seu
caminho parecia inútil. Também, vós caminhais, no mundo, contra corrente: a
vida do mundo facilmente rejeita a pobreza, a castidade e a obediência. Mas,
como aquelas mulheres, continuai para diante, não obstante as preocupações com
as pedras pesadas a remover (cf. Mc 16, 3). E, como aquelas mulheres, primeiro
encontrai o Senhor ressuscitado e vivo, estreitai-O ao coração (cf. Mt 28, 9) e, logo a seguir, anunciai-O aos
irmãos, com olhos que brilham de grande alegria (cf. Mt 28, 8). Sois, assim, a alvorada
perene da Igreja: vós, consagrados e consagradas, sois a alvorada perene da
Igreja! Desejo que hoje mesmo possais reavivar o encontro com Jesus, caminhando
juntos para Ele: isto dará luz aos vossos olhos e vigor aos vossos passos… (cf.
Santa Sé)