BEATO VICENTE VILAR DAVID
Vicente Vilar David teve como marco histórico da sua
vida a última década do século XIX e as quatro primeiras do século XX. Estes
anos, em Espanha, foram caracterizados por fortes contrastes e instabilidade
política, assim como por fortes transformações socioeconómicas que tiveram como
consequência a proclamação da república e a guerra civil. Foi neste clima e
nestas circunstâncias ambientais concretas que se desenrolou a vida de Vicente
Vilar David que, como leigo católico, soube dar uma resposta exacta e adequada
às necessidades sociais e eclesiais do seu tempo.
Vicente nasceu em Manises – Valência, Espanha no dia
28 de Junho de 1889. Os seus pais foram Justo Vilar Arenes e Cármen David
Gimeno. Foi o último de oito irmãos. Recebeu o baptismo no dia seguinte ao seu
nascimento, na igreja paroquial de S. João Baptista, das mãos do Padre Nicolau
David Campos, primo directo da sua mãe. Viveu e foi crescendo no ambiente de um
lar cristão, cheio de virtudes cristãs e de um grande amor ao próximo.
No dia 1 de Abril de 1898, o Cardeal Ciríaco Sancha y
Hervás, arcebispo de Valência, administrou-lhe o Sacramento de Confirmação e,
dois anos mais tarde, no dia 24 de Abril de 1900, recebeu a primeira Comunhão
das mãos do Padre José Catalã Sanchis.
Frequentou a escola primária da sua terra natal. Do
seu mestre, Buenaventura Guillem, recebeu, então, os primeiros rudimentos do
ensino, mas também valores cristãos e humanos que afirmaram a sua
personalidade. Realizou, depois, os seus estudos secundários num dos colégios
dos padres Esculápios de Valência. Formou-se em Engenharia na Escola Superior
de Barcelona. Durante estes anos, deu sempre mostras da sua dedicação à Igreja
e ao apostolado secular.
Casou com Isabel Rodes Reig, no dia 30 de Novembro de
1922 e, desde então, ambos se entregaram fervorosamente ao apostolado em
Manises.
Depois da morte do seu pai e tendo terminado os
estudos de Engenharia, assumiu a direcção da empresa de cerâmica, chamada
“Filhos de Justo Vilar”: foi aqui que Vicente exerceu, pela sua acção secular
exemplar, o melhor do seu apostolado, sobretudo sob o ponto de vista social, procurando
para todos a maior harmonia, buscando a paz nas desavenças e procurando que
sempre se chegasse a um acordo que a todos satisfizesse.
Destacou-se igualmente pelo respeito, a educação e a
caridade para com todos os empregados, o que teve como resultado que todos,
igualmente, o amassem, porque nele viam mais um amigo do que um patrão. Sempre
se mostrou disposto a ajudá-los nas suas necessidades, quaisquer que fossem as
circunstâncias e dificuldades. Deu, assim, um bom exemplo de patrão católico,
consciente de tudo quanto o Papa Leão XIII pedira na sua famosa Encíclica
“Rerum novarum”.
Tendo novas ideias sobre a cerâmica, quis pôr em
prática quanto aprendera, quanto idealizara durante os seus estudos, e assim
fez. Com efeito, criou uma escola de cerâmica, na qual pôs em prática o que
aprendera e idealizara e, pouco depois mostrava já uma visão de futuro e se
percebia que com esta se conseguia a actualização industrial da cerâmica a fim
de a tornar competitiva sob o ponto de vista internacional.
Mas o “selo” de Vicente Vilar não se limitou as estas
acções “terra à terra”, mas também e, talvez sobretudo, a acções espirituais
desenvolvidas na sua própria paróquia. Foi catequista, membro de associações
eucarísticas e colaborador incondicional do pároco.
Quando, com a República, em 1931, se implantou um
regime que começou a perseguir a Igreja e os cristãos, Vicente Vilar ajudou muitos
sacerdotes no exercício do seu ministério e colaborou, activamente, no ensino
religioso, na dinamização paroquial e no encorajamento dos movimentos e organizações
paroquiais. Para que isso se tornasse possível, não hesitou em fundar um
Patronado de Acção Social.
Em Agosto de 1936, no auge da perseguição religiosa, pelo
simples facto de ser católico, foi destituído do cargo de secretário e de professor
da escola de cerâmica que ele mesmo tinha fundado.
Naqueles tempos difíceis, Vicente Vilar foi o auxílio
de todos; o semeador de alegria e de paciência cristãs. Mesmo os seus
trabalhadores, naqueles momentos difíceis, foram os seus protectores,
demonstrando, assim, o reconhecimento e o carinho que tinham para com este
homem de Deus, cuja missão muito apreciavam. Mas, se os seus empregados o
amavam, todos aqueles que odiavam a religião e os que para eles trabalhavam,
não podiam aceitar que este homem rico, mas pobre segundo o Evangelho,
continuasse a sua missão. Vicente tornara-se, para eles e para a sua ideologia,
um estorvo. Por isso, na noite de 14 de Fevereiro de 1937, Vicente foi preso e
levado diante de um “tribunal popular” - como então constantemente se fazia -
e, como não negou a sua fé, nem a bondade do seu trabalho empresarial e
apostólico, e não aceitou as soluções que o dito tribunal lhe propunha, depois
de um julgamento sumário, foi condenado, não de maneira explícita, mas
condenado na mesma. Foi imediatamente fuzilado, perdoando a todos os que eram
responsáveis por tão triste e temerária decisão.
Este acto, que se pode chamar bárbaro, foi considerado
pelos paroquianos de Manises como uma vingança, pelo facto de Vicente ser
católico; um zeloso apóstolo das verdades cristãs; e também por ser um patrão
social e amigo dos seus empregados.
Os restos mortais de Vicente encontram-se na igreja
paroquial de São João Baptista de Manises, onde, de diversas partes de Espanha,
e mesmo do estrangeiro, os peregrinos se inclinam e veneram o homem que
preferiu dar a sua vida do que renegar a sua fé autêntica.
Vicente Vilar David foi beatificado, no dia 1 de
Outubro de 1995, pelo Papa João Paulo II, sendo o primeiro mártir secular,
beatificado nos tempos modernos. Na homilia da Missa, o Papa disse: “… ‘Irmão,
servo de Deus: pratica… a justiça’. Enriquece, também, o martirológico de
Valência, desde a sua cidade natal de Manises, o Beato Vicente Vilar David, que
coroou com o martírio a sua existência, vivida com total dedicação a Deus, ao
próximo e à promoção da justiça no mundo laboral, de forma especial na Escola
de Cerâmica e no Patronato de Acção Social. A oração e a sua grande devoção à
Eucaristia alimentaram toda a sua vida, de modo que o seu trabalho tinha a
marca da presença de Deus. O estado matrimonial, o exercício da profissão, as actividades
que são próprias dos seculares são caminhos que conduzem à santidade, se são
vividos com sinceridade e entrega evangélica, como exigências do baptismo…”
A memória litúrgica do Beato Vicente David celebra-se
no dia 14 de Fevereiro.