PALAVRA COM SENTIDO

PALAVRA COM SENTIDO “… Eu dou a minha vida pelas minhas ovelhas…" (cf. João 10, 15) “…Este ano o trecho evangélico é o central do capítulo 10 de João, e começa precisamente com a afirmação de Jesus: «Eu sou o bom pastor», seguida imediatamente pela primeira característica fundamental: «O bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas» (Jo 10, 11). Portanto, neste aspecto nós somos levados imediatamente ao centro, ao ápice da revelação de Deus como pastor do seu povo; este centro e ápice é Jesus, precisamente Jesus que morre na cruz e no terceiro dia ressuscita do sepulcro, ressuscita com toda a sua humanidade, e deste modo envolve cada um de nós, cada homem, na sua passagem da morte para a vida. Este acontecimento — a Páscoa de Cristo — em que se realiza plena e definitivamente a obra pastoral de Deus, é um evento sacrifical: por isso, o Bom Pastor e o Sumo-Sacerdote coincidem na pessoa de Jesus, que deu a vida por nós. (…) Voltemos ao Evangelho e à parábola do pastor. «O bom pastor dá a vida pelas suas ove-lhas» (Jo 10, 11). Jesus insiste sobre esta característica essencial do verdadeiro pastor, que é Ele mesmo: a do «dar a sua vida». Repete-o três vezes e no final conclui, dizendo: «Por isso, o Pai me ama: porque dou a minha vida, para poder retomá-la. Ninguém Ma tira, sou Eu que a dou espontaneamente. Tenho o poder de a dar e de a retomar: foi este o mandamento que recebi de meu Pai» (Jo 10, 17-18). Claramente, esta é a característica qualificadora do pastor, como Jesus o interpreta pessoalmente, segundo a vontade do Pai que O enviou. A figura bíblica do rei-pastor, que compreende principalmente a tarefa de reger o povo de Deus, de o manter unido e de o orientar, toda esta função régia se realiza plenamente em Jesus Cristo, na dimensão sacrifical, no ofertório da vida. Numa palavra, realiza-se no mistério da Cruz, ou seja, no gesto supremo de humildade e de amor oblativo. O abade Teodoro Estudita diz: «Por meio da cruz nós, ovelhinhas de Cristo, fomos congregados num único aprisco, e fomos destinados às moradas eternas» (Discurso sobre a adoração da Cruz: PG 99, 699)…” (Papa Bento XVI, IV Domingo de Páscoa, 29 de Abril de 2012)

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

SANTOS POPULARES



BEATO JESÚS EMILIO 
JARAMILLO MONSALVE

Jesús Emilio Jaramillo Monsalve nasceu no dia 16 de Fevereiro de 1916, em Santo Domingo, na província de Antioquia, diocese de Medellín, Colômbia. Era filho de Alberto Jaramillo, artesão, e Cecilia Monsalve, dona de casa. Foi baptizado no dia seguinte ao seu nascimento, na igreja paroquial, dedicada a São Domingos de Guzmão. Tinha uma irmã, Maria Rosa, com quem frequentou a escola primária, na aldeia. A família era pobre, mas não reclamava da sua condição.
Os pais, profundamente crentes, receberam bem a notícia de que Jesús Emilio estava disposto a entrar no seminário. Não na diocese, mas no Instituto das Missões Estrangeiras de Yarumal, fundada recentemente por Dom Miguel Ángel Builes, bispo de Santa Rosa de Osos. O objectivo deste Instituto era preparar padres para serem enviados para as zonas mais carentes de assistência espiritual da Colômbia.
Em Fevereiro de 1929, com treze anos de idade, Jesús Emilio começou a frequentar o Seminário Menor do Instituto das Missões Estrangeiras de Yarumal. Naquela altura, este Seminário era frequentado por setenta rapazes, acompanhados por cinco padres, mas todos estavam animados por um profundo sentimento missionário, incutido pelo exemplo do fundador.
Jesús Emilio começou a mostrar as suas qualidades: tinha uma bela voz; gostava de praticar desporto e dedicava, muito do seu tempo, à leitura. Era de poucas palavras, excepto quando tinha de falar em público. Acima de tudo, começou a destacar-se pela sua dedicação ao trabalho - cumprindo os seus deveres com prontidão e alegria – à oração e ao estudo.
Em 1934, iniciou os estudos em ordem ao sacerdócio, frequentando dois anos de Filosofia. Uma vez terminado o curso de Filosofia, começou o noviciado. Três meses depois, no dia 3 de Dezembro de 1936, fez o seu primeiro compromisso no Instituto: a promessa de obediência.
Entre 1937 e 1940, frequentou o Curso de Teologia. Se, por um lado, se destacava como um grande orador nos principais eventos do Seminário, por outro, procurava ser humilde, serviçal, amigo de todos, merecendo, por isso, o respeito dos seus companheiros e dos seus educadores.
As várias etapas, no caminho para o sacerdócio, foram superadas com dedicação e com simplicidade: a tonsura, as ordens menores, o diaconado. Finalmente, foi ordenado sacerdote, no dia 1 de Setembro de 1940, e celebrou a sua primeira missa (a missa nova) na igreja paroquial da sua terra natal.
Depois de passar algum tempo com a sua família, o Padre Jesús Emilio foi enviado, pelos seus superiores, para Sabanalarga, na época na diocese de Barranquilla. Três semanas depois da ordenação, Jesús Emilio escreveu ao Reitor do Seminário, Padre Aníbal Muñoz Duque, dizendo: "Creio que agora o meu espírito está mais capaz de apreciar a grandeza da minha vocação missionária. Sinto-me totalmente de Cristo. Sinto nascer nas minhas entranhas um imenso amor pelas minhas ovelhas».
Esta experiência durou apenas quatro meses. Em 1941, foi nomeado professor do Seminário. Ao mesmo tempo, foi capelão da Prisão Feminina de Bogotá, onde fez nascer um grande fervor espiritual.
Orientou, também, muitos retiros para sacerdotes e leigos. Pregou muitos sermões, sobretudo por ocasião das solenidades litúrgicas da Semana Santa. Em suma, tornou-se um dos maiores oradores sacros do país. Além disso, exerceu a missão de director espiritual de muitos religiosos e seminaristas.
Entre 1942 e 1944 frequentou a Pontifícia Universidade Saveriana de Bogotá, obtendo o doutorado em Teologia Dogmática com uma tese - que obteve a mais alta classificação – intitulada "A liberdade de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Tomás de Aquino."
Aos trinta anos, o Padre Jesús Emilio foi nomeado mestre de noviços. Ocupou esta função até ao primeiro Capítulo-Geral do Instituto, em 1950, quando foi eleito Segundo Assistente do Superior -geral e Reitor do Seminário.
Os seus discípulos lembram da sua vitalidade – continuava a praticar patinagem e ciclismo - e do seu riso aberto e cordial. Não fugia das situações difíceis, mas fazia-se perto dos seus filhos que aspiravam à missão. Quando estava em oração, o seu rosto era sereno, desprovido de afectações, sinal de uma fé firme e segura.
Em 1956, depois do segundo Capítulo-Geral, foi escolhido pelo novo Superior Geral, Monsenhor Gerardo Valencia Cano, como seu Vigário Delegado, com as funções do Ordinário. Três anos depois, monsenhor Cano renunciou ao cargo de Superior-Geral. Então, o Padre Jesús Emilio tornou Superior-Geral do Instituto das Missões Estrangeiras de Yarumal
Neste período, os Missionários de Yarumal receberam o primeiro convite para passar as fronteiras da Colômbia e partir em missão: África foi o seu primeiro destino. Ao mesmo tempo, o Padre Jesús Emilio fundou o Colégio Ferrini, em Medellín, em homenagem ao franciscano terciário e professor universitário, Contardo Ferrini (beatificado em 1947). Durante muitos anos, este colégio, foi um centro de excelência, dedicado à formação dos leigos.
O mandato do Padre Jesús Emilio como Superior-Geral deveria durar dez anos; ele, porém, apressou-se a implementar as directrizes promulgadas durante o Concílio Vaticano II, que limitava esta tarefa a um período de seis anos.
Livre dos compromissos de governo do Instituto, serviu a Conferência Episcopal da Colômbia, como Conselheiro, no Conselho Nacional de Leigos. Retomou, também, a sua actividade de professor no Colégio Ferrini, de Medellín.
Em 8 de Janeiro de 1970, morreu Monsenhor Luis Eduardo García, Prefeito-Apostólico de Arauca e missionário de Yarumal. Pouco depois, a Santa Sé elevou esta Prefeitura a Vicariato-Apostólico: o seu primeiro Vigário-Apostólico foi o Padre Jesús Emilio, nomeado no dia 11 de Novembro de 1970.
No dia 10 de Janeiro de 1971, foi ordenado bispo, por Monsenhor Ângelo Palmas, Núncio-Apostólico na Colômbia, com o título episcopal de Strumizza. Como um lema, assumiu um versículo do profeta Zacarias (14, 5): "Vigiai! O Senhor vem!”
No dia da sua Ordenação episcopal, rezou, assim, no seu discurso: "Concede-me, Senhor, o dom imerecido de não desiludir as esperanças daqueles que confiam na debilidade das minhas forças. Espero que se tornem fortes como funda de David, apoiado pelo poder invencível da tua graça”.
Em 19 de Julho de 1984, o Vicariato de Arauca foi elevado a Diocese: Dom Jaramillo tornou-se o seu primeiro bispo residencial. O seu vasto território incluía duas regiões muito diferentes: as Planícies Orientais e a floresta de Sarare. O bispo exerceu o seu novo ministério nessas áreas, onde tinha recomeçado a violência armada contra os senhores que punham e dispunham do povo. Entre o clero, Dom Jaramillo, encontrou, também, muitas resistências. Para libertar o país da miséria e da opressão, alguns padres tornaram-se guerrilheiros. Era evidente a descristianização, que avançava na Colômbia.
Monsenhor Jaramillo estava ciente de tudo isso: trabalhou, arduamente, para proteger a vida e a dignidade dos seus fiéis. Promoveu várias iniciativas em defesa dos direitos humanos, especialmente dos pobres, sem perder de vista importância da Palavra de Deus. Criou novas paróquias e fundou dois organismos especiais: o Instituto São José Operário, em Saravena, para a formação humana e cristã dos camponeses, e a “Equipa do Índio”, para a evangelização dos índios do Sarare.
Estas actividades não eram bem vistas pelas forças que queriam libertar a Colômbia usando a violência, de modo especial o Exército de Libertação Nacional (ELN). Surgiram muitos ataques difamatórios e muitas calúnias. Outros acusavam-no de ser morno e medíocre, não perdoando os seus erros humanos.
Monsenhor Jaramillo não se deixou perturbar e perdoou aos que o ofenderam. Não se gabava dos dons recebidos e continuou com o seu treinamento artístico e cultural. Continuou a proclamando o Evangelho, mesmo sabendo bem o que poderia acontecer-lhe.
No Sábado, 30 de Setembro de 1989, Dom Jaramillo dirigiu-se a La Esmeralda e dali, no dia seguinte, partiu para Fortul, onde era esperado para a visita pastoral. No dia seguinte, foi para Puerto Nidio, também para a visita pastoral. Estava acompanhado pelo Padre Rubin, pároco de  Fortul, pelo Padre Leon, pároco de Zarabanda, pelo Padre Helmer Muñoz, que conduzia o jipe, pelo seminarista Germán Piracoca e pela  secretária da Paróquia de Fortul.
Depois de atravessarem uma ponte de madeira, na estrada entre Fortul e Tame, o veículo foi forçado a parar, por três homens armados e vestidos como camponeses. Minutos depois, os três perguntaram quem era Jesús Jaramillo Monsalve. O bispo respondeu. Com modos gentis, ordenaram que todos saíssem do jipe ​​e repetiram a mesma pergunta. Monsenhor Jaramillo respondeu de novo que era ele. Naquele momento, disseram-lhe que precisavam dele para que fizesse uma breve declaração a ser enviada ao Governo nacional. Em seguida, perguntaram quem é que sabiam conduzir o jipe. O Padre Helmer deu alguns passos em frente e logo percebeu que o Bispo estava prestes a ser sequestrado. Os sequestradores, membros do ELN, ordenaram que todos se colocassem na beira da estrada e partiram, seguindo primeiramente para o norte e, depois, para leste.
Quando chegaram a um lugar isolado, por volta das sete horas da tarde, fizeram-nos sair do jipe e disseram-lhes que deviam esperar ordens dos seus superiores. Disseram ao Padre Helmer para se afastar, porque só o bispo deveria ir com eles.
Perante a insistência do padre, que não o queria deixar só, Dom Jaramillo chamou-o à parte e disse-lhe: "Coloquemo-nos nas mãos do Senhor e que seja feita a Sua vontade”.
Dito isto, deram-se um ao outro a absolvição. O Bispo pediu ao Padre Helmer que, por obediência, saísse dali, para não complicar as coisas.
Até os sequestradores lhe ordenaram que se fosse embora, prometendo que no dia seguinte voltariam com Bispo. Enquanto se afastava, o Padre Helmer ouviu as últimas palavras de Monsenhor Jaramillo: "Eu falo com quem devo falar mas, por favor, não façam nada ao meu rapaz".
Nas primeiras horas do dia 3 de Outubro, o Padre Helmer veio à procura do seu Bispo, no lugar indicado pelos guerrilheiros. Por volta das 8 horas, encontrou-o morto: tinha sinais de tortura e várias feridas feitas por arma de fogo. Não tinha o anel episcopal nem a cruz peitoral; a corrente da qual pendia tinha sido quebrada.
Através do então Secretário de Estado do Vaticano, o Cardeal Agostino Casaroli, o Papa João Paulo II enviou as suas condolências à Conferência Episcopal Colombiana, onde assegurava as suas orações para obter "o descanso eterno à alma exemplar do zeloso Pastor, que dedicou toda a sua vida ao serviço do povo de Deus, pregando a reconciliação e o amor cristão ".
Os restos mortais de Monsenhor Jesús Emilio Jaramillo Monsalve foram sepultados na Catedral de Arauca. No dia 24 de Agosto de 2017, foram exumados e colocados numa capela lateral, da mesma catedral.
No dia 7 de Julho de 2017, o Papa Francisco autorizou a promulgação do decreto que declarava que o Bispo Dom Jesús Emilio Jaramillo foi considerado mártir da fé.
Dom Jesús Emilio - juntamente com o Padre Pedro María Ramírez Ramos - foi beatificado no dia 8 de Setembro de 2017, em Villavicencio, pelo Papa Francisco, durante a sua visita apostólica à Colômbia.
Na Eucaristia, o Papa disse: “…A reconciliação não é uma palavra que devemos considerar abstracta; se assim fosse, traria apenas esterilidade, traria maior distância. Reconciliar-se é abrir uma porta a todas e cada uma das pessoas que viveram a realidade dramática do conflito. Quando as vítimas vencem a tentação compreensível da vingança, quando vencem esta tentação compreensível da vingança, tornam-se nos protagonistas mais credíveis dos processos de construção da paz. É preciso que alguns tenham a coragem de dar o primeiro passo nesta direcção, sem esperar que o façam os outros. Basta uma pessoa boa, para que haja esperança. Não esqueçais isto: basta uma pessoa boa, para que haja esperança. E cada um de nós pode ser esta pessoa! Isto não significa ignorar ou dissimular as diferenças e os conflitos. Não é legitimar as injustiças pessoais ou estruturais. O recurso à reconciliação concreta não pode servir para se acomodar em situações de injustiça. Pelo contrário, como ensinou São João Paulo II, «é um encontro entre irmãos dispostos a vencer a tentação do egoísmo e a renunciar aos intentos duma pseudo-justiça; é fruto de sentimentos fortes, nobres e generosos, que levam a estabelecer uma convivência fundada sobre o respeito de cada indivíduo e dos valores próprios de cada sociedade civil» (Carta aos Bispos de El Salvador, 6/VIII/1982). Por isso, a reconciliação concretiza-se e consolida-se com a contribuição de todos, permite construir o futuro e faz crescer a esperança. Qualquer esforço de paz sem um compromisso sincero de reconciliação será sempre um fracasso.
O texto do Evangelho, que ouvimos, culmina chamando a Jesus o Emanuel, que significa Deus connosco. E como começa, assim termina Mateus o seu Evangelho: «Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos» (28, 20). Jesus é o Emanuel que nasce e o Emanuel que nos acompanha todos os dias, é o Deus connosco que nasce e o Deus que caminha connosco até ao fim do mundo. Esta promessa realiza-se também na Colômbia: D. Jesús Emilio Jaramillo Monsalve, Bispo de Arauca, e o sacerdote Pedro Maria Ramírez Ramos, mártir de Armero, são sinal disso, expressão dum povo que quer sair do pântano da violência e do rancor.
Neste ambiente maravilhoso, cabe-nos a nós dizer «sim» à reconciliação concreta; e, neste «sim», incluamos também a natureza. Não é por acaso que, inclusive sobre ela, se tenham desencadeado as nossas paixões possessivas, a nossa ânsia de domínio. Um vosso compatriota canta-o com primor: «As árvores estão a chorar, são testemunhas de tantos anos de violência. O mar aparece acastanhado, mistura de sangue com a terra» (Juanes, Minhas Pedras). A violência que existe no coração humano, ferido pelo pecado, manifesta-se também nos sintomas de doença que notamos no solo, na água, no ar e nos seres vivos (cf. Francisco, Carta enc. Laudato si’, 2). Cabe-nos dizer «sim» como Maria e cantar com Ela as «maravilhas do Senhor», porque, como prometeu aos nossos pais, Ele ajuda todos os povos e ajuda cada povo, e ajuda a Colômbia que hoje quer reconciliar-se e à sua descendência para sempre…”
A sua memória litúrgica faz-se no dia 3 de Outubro.