SANTA MARIA
BERTILA BOSCARDIN
Ana Francisca Boscardin nasceu
dia 6 de Outubro de 1888, na aldeia de Brendola, em Vicenza, Itália. Os seus
pais, Ângelo Boscardin e Maria Teresa Benetti, eram simples camponeses, dedicados
ao amanho das terras, para delas obter o sustento da família.
Anita, como familiarmente a
tratavam, era uma menina tranquila e muito trabalhadora, cuja infância não teve
nada de pitoresco ou extraordinário. O seu pai era um homem ciumento e dado à
bebida, de maneira que, na sua casa, eram frequentes as desavenças entre o
casal. Desde pequena, Anita ajudava a mãe nos cuidados da casa e o pai nos
trabalhos do campo e, sempre que podia, prestava serviços nas casas dos
vizinhos para ajudar, com os seus ganhos, na economia doméstica. Sendo a mais
velha dos três filhos do casal, sua infância transcorreu entre a casa e o
campo, rotina natural dos filhos e das filhas de agricultores dessa época. Por
isso, faltava muito à escola, não podendo acompanhar as outras crianças no
progresso escolar. Os seus companheiros de brincadeiras chamavam-lhe “a
tontinha”.
Instruída pela mãe, desde a idade
dos cinco anos Anita gostava de rezar e passava muito tempo, de joelhos, diante
de um quadro de Nossa Senhora que se encontrava na cozinha.
Aos nove anos, fez sua
Primeira Comunhão, facto não muito comum, naquela época. Aos treze anos, fez
voto de ser toda para Jesus, oferecendo-lhe o seu coração para a Sua vontade.
Quando manifestou ao pároco o desejo de se tornar religiosa, este lhe
respondeu: “Anita, tu não serves para
nada. As religiosas não saberiam o que fazer duma aldeã ignorante como tu és”.
Mas o padre arrependeu-se da sua resposta e chamou-a no dia seguinte.
Aos dezassete anos, no dia 8
de Abril de 1905, Anita saiu da casa paterna para entrar no Convento das Irmãs
Mestras de Santa Doroteia dos Sagrados Corações, adoptando o nome de Maria Bertila.
Forte e robusta, os trabalhos mais custosos – o forno e a lavandaria –
foram-lhe designados. Fez o segundo ano de noviciado no hospital de Treviso. A
Superiora-Geral desejava que fosse enfermeira, mas a superiora do hospital, a
Irmã Margarida, pô-la na cozinha, como ajudante de uma freira mais idosa e
enferma. Mas, algum tempo depois, voltou ao Convento.
A Superiora Geral era muito
persistente e, mais uma vez, decidiu que ela deveria ser enfermeira e mandou-a
de novo para o hospital de Treviso.
“Tu de novo aqui! - exclamou
ao vê-la a Irmã Margarida. Preciso de enfermeiras para a cirurgia e para as
doenças contagiosas, e mandam-me gente desta!”… E, mais uma vez, mandou-a para
as panelas. Porém, no dia seguinte, por falta de pessoal, foi colocada na secção
infantil, onde havia crianças atacadas de difteria. Num instante, a enfermeira
adormecida dentro dela revelou-se inteligente e ágil, impondo respeito e
confiança.
Foi então que estudou e
diplomou-se em enfermeira, de modo que pôde tratar os doentes com ciência e fé,
assistindo-os com carinho de irmã e de mãe, qualidades que mostrou, sobretudo, durante
a Primeira Guerra Mundial. A Irmã Maria Bertila surpreendeu a todos com a sua
incansável disposição e solidariedade de religiosa e enfermeira, no tratamento
dos feridos de guerra. Tinha conseguido obter o diploma de enfermeira para se
tornar mais útil aos doentes, que assistia também de noite, tomando a vez das
suas co-irmãs. “Quero ser a serva de todos – escreveu no seu diário – quero
trabalhar, sofrer e deixar toda a satisfação aos outros.” E ainda: “Devo
considerar-me a última de todas, portanto contente em ser passada para trás,
indiferente a tudo, quer às reprovações, quer aos elogios; é bem melhor,
preferir as primeiras. Procurarei ser sempre condescendente com as opiniões
alheias; nunca desculpar-me, mesmo se penso ter razão; nunca falar de mim
mesma; os encargos mais baixos sejam sempre os meus, pois é isso que mereço.”
Teve uma existência de união
com Deus, no silêncio, no trabalho, na oração e na obediência. Isto reflectia-se
na caridade com que se relacionava com todos: doentes, médicos e superiores.
Mas era submetida a constantes humilhações por parte da superiora do hospital
Tinha apenas vinte e dois anos
de idade quando, além de enfrentar a doença no próximo, teve que enfrentá-la em
si mesma: foi operada a um tumor e, antes que pudesse recuperar-se totalmente,
já estava junto dos seus doentes. O seu mal agravou-se e, aos trinta e quatro
anos, foi sujeita a uma segunda cirurgia, mas não resistiu.
Anita – a Irmã Maria Bertila -
faleceu no dia 20 de Outubro de 1922, no hospital de Treviso, depois de
converter, com a sua agonia resignada e serena, o médico-chefe do hospital. O
seu corpo foi sepultado na Casa-mãe da Congregação, em Vicenza.
Muitos milagres têm acontecido
junto do seu túmulo e referidos à sua intercessão.
A Irmã Bertila foi beatificada, no dia 8 de Junho de 1952, pelo
Papa Pio XII. Nesta ocasião, o Papa afirmou: “…É uma humilde camponesa!... Mas
uma figura puríssima de perfeição cristã, modelo de recolhimento e de oração.
Nem êxtases, nem milagres durante a vida, mas uma união com Deus sempre mais
profunda no silêncio, no trabalho, na oração, na obediência. Daquela união
vinha a especial caridade que ela demonstrava para com os doentes, médicos,
superiores, enfim, para com todos… A vida da Beata Maria Boscardin provou que a
santidade é feita de atitudes diárias de união com Nosso Senhor e com a sua Mãe
Santíssima. Vivendo na pureza e na fé profunda, a graça divina manifestou-se
nela e é um exemplo do que esta graça pode fazer em cada um de nós, se formos
fieis a Deus e aos seus Mandamentos.
Esta humilda camponesa teve o
privilégio de ter uma mãe extraordinária que, diante da pobreza, da
irascibilidade do marido, do permanente ambiente de mal-estar, das dificuldades
da vida, calava-se, tinha paciência, rezava muito. Os filhos de Maria Teresa
Benetti viam tudo isto e ouviam sempre sair de seus lábios palavras suaves que
falavam de Deus, da Fé, do Céu, da resignação... Felizes as crianças que têm
uma mãe como esta!...”
Maria Bertila Boscardin foi canonizada,
no dia 11 de Maio de 1961, festa da Ascensão de Nosso Senhor, pelo Papa João
XXIII. Ela que morreu tão simples como tinha vivido, foi canonizada na Basílica
de São Pedro, no meio a luzes, galas e uma liturgia papal magnífica. Na Homilia
da Missa, o Papa disse: “…A virgem que hoje cingimos com a coroa das Santas,
pela sua piedade, modéstia, paciência nos sofrimentos; pelo seu zelo de
caridade com os enfermos, temos de a considerar como uma flor do campo que,
rica de graça, espalha um suavíssimo perfume. Ela, com o seu exemplo de vida,
convida todos a meditar e a observar os divinos mandamentos e desafia todos a
seguir e a amar Cristo, autor da nossa salvação…
A humilde religiosa de
Brendola é a confirmação de uma tradição que faz das paróquias fervorosas a
primeira escola de uma vida boa e santa. Santa Bertila está, agora, nos
altares, acima dos sábios e prudentes do século. Não teve oportunidade de um
grande percurso de aprendizagem, mas cumpriu, de bom grado, toda a missão que
lhe foi confiada. O seu livro mais querido, e agora conservado entre as
recordações da sua vida, foi o catecismo que o seu pároco lhe ofereceu. Nele se
inspirava e encontrava consolo desde pequena, retirando-se, com alegria, para a
solidão - depois de ter concluído os trabalhos domésticos – para o ler e reler
constantemente e, assim, poder ensiná-lo com entusiasmo aos da sua idade…
Eis, aqui, uma alma simples
que, no primeiro momento do despertar vocacional, se alegra por poder responder
sim, ajudada pelo respeito e o consentimento dos seus pais; que se sente feliz,
também, no realizar os mais humildes serviços, porque nada pede para si, não
procura curiosas distrações ou preferências pessoais. E, sem dúvida, o
testemunho de vida da Irmã Bertila espalha-se pelos corredores do hospital de
Treviso, no contacto com os doentes, consolando, tranquilizando, pronta e
disponível; competente e silenciosa até ao ponto de proclamar aos distraídos
que Alguém – quer dizer, o Senhor – estava sempre com ela, dirigindo-a e
iluminando-a. A santidade que dela irradiava não se extinguiu com a sua morte,
mas continuou a derramar os benefícios da santidade, num âmbito cada vez maior,
sobre as almas que a ela se confiavam, até ao triunfo de hoje.
A memória litúrgica de Santa
Maria Bertila Boscardin celebra-se no dia 20 de Outubro.