PALAVRA COM SENTIDO

PALAVRA COM SENTIDO “… Maria pôs-se a caminho…” (cf. Lucas 1, 39) “…O Evangelho deste domingo de Advento põe em evidência a figura de Maria. Vemo-la quando, imediatamente depois de ter concebido, na fé, o Filho de Deus, enfrenta a longa viagem de Nazaré da Galileia, até aos montes da Judeia para visitar e ajudar Isabel. O anjo Gabriel revelara-lhe que a sua idosa parente, que não tinha filhos, estava no sexto mês de gravidez (cf. Lc 1, 26.36). Por isso, Nossa Senhora, que traz em si um dom e um mistério ainda maior, vai ao encontro de Isabel e permanece três meses com ela. No encontro entre as duas mulheres — imaginai: uma idosa e a outra jovem; é a jovem, Maria, que saúda primeiro. O Evangelho reza assim: «Entrou na casa de Zacarias e saudou Isabel» (Lc 1, 40). E, após aquela saudação, Isabel sente-se envolvida por um grande enlevo — não vos esqueçais desta palavra: enlevo. O enlevo! Isabel sente-se arrebatada por um grande enlevo que ressoa nas suas palavras: «Donde me é dado que venha ter comigo a mãe do meu Senhor?» (v. 43). E, cheias de alegria, as duas mulheres abraçam-se e beijam-se: a idosa e a jovem, ambas grávidas. Para celebrar o Natal de modo profícuo, somos chamados a meditar sobre os «lugares» do enlevo. Então, quais são estes lugares do enlevo na vida quotidiana? São três! O primeiro é o outro, no qual devemos reconhecer um irmão, porque, desde que teve lugar o Natal de Jesus, cada rosto tem gravado, em si, o semblante do Filho de Deus. Sobretudo quando se trata da face do pobre, pois foi como pobre que Deus entrou no mundo e foi antes de tudo pelos pobres que se deixou aproximar. Outro lugar do enlevo — o segundo — onde, se olharmos com fé, sentimos precisamente o enlevo é a história. Muitas vezes, julgamos vê-la de modo correcto, e contudo corremos o risco de a ver ao contrário. Por exemplo, acontece quando ela nos parece determinada pela economia de mercado; regulada pelas finanças e pelos negócios, dominada pelos poderosos do momento. No entanto, o Deus do Natal é um Deus que «mistura as cartas»: Ele gosta de agir assim! Como canta Maria, no Magnificat, é o Senhor que derruba os poderosos dos tronos e exalta os humildes, sacia de bens os famintos e despede de mãos vazias os ricos (cf. Lc 1, 52-53). Eis o segundo enlevo, a surpresa da história! Um terceiro lugar do enlevo é a Igreja: contemplá-la com a surpresa da fé significa não limitar-se a considerá-la somente como instituição religiosa, tal como é; mas senti-la como uma Mãe que, apesar das manchas e das rugas — temos tantas! — contudo, deixa transparecer os lineamentos da Esposa amada e purificada por Cristo Senhor. Uma Igreja que sabe reconhecer os numerosos sinais de amor fiel que Deus lhe transmite continuamente. Uma Igreja para a qual o Senhor Jesus nunca será uma posse a defender ciosamente: quantos agem assim, cometem um erro; Ele é sempre Aquele que vai ao seu encontro, e ela sabe esperá-lo com confiança e alegria, dando voz à esperança do mundo. A Igreja que chama o Senhor: «Vem, Senhor Jesus!». A Igreja mãe que mantém as suas portas escancaradas, e os braços abertos para receber todos. Aliás, a Igreja mãe que sai pelas suas portas para ir, com sorriso de mãe, ao encontro de todos os distantes, para lhes levar a misericórdia de Deus. Esta é a surpresa do Natal! No Natal, Deus entrega-se totalmente a nós, oferecendo-nos o seu único Filho, que é toda a sua alegria. E somente com o Coração de Maria, a humilde e pobre filha de Sião, que se tornou Mãe do Filho do Altíssimo, é possível exultar e alegrar-se pelo imenso dom de Deus e pela sua surpresa imprevisível. Que Ela nos ajude a sentir o enlevo — estas três surpresas: o outro, a história e a Igreja — devido à Natividade de Jesus, o dom dos dons, o presente imerecido que nos traz a salvação. O encontro com Jesus levar-nos-á, também a nós, a sentir esta grandiosa surpresa! Mas não podemos sentir este enlevo, não podemos encontrar Jesus, se não O encontrarmos no próximo, na história e na Igreja…” (Papa Francisco, Oração do Angelus, 20 de Dezembro de 2015)

sábado, 14 de dezembro de 2024

PALAVRA DO PAPA FRANCISCO

 


- na Audiência-Geral, Sala Paulo VI, Vaticano, Roma, no dia 11 de Dezembro de 2024.
 
Caríssimos irmãos e irmãs, bom dia!
Concluímos as nossas catequeses sobre o Espírito Santo e a Igreja. Dedicamos esta última reflexão ao título que demos a todo o ciclo, ou seja: “O Espírito e a Esposa. O Espírito Santo conduz o Povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança”. Este título refere-se a um dos últimos versículos da Bíblia, no Livro do Apocalipse, que diz: «O Espírito e a esposa dizem: “Vem!”» (Apoc 22, 17). A quem se dirige esta invocação? Dirige-se a Cristo ressuscitado. Com efeito, tanto São Paulo (cf. 1 Cor 16, 22) como a Didaché - um escrito dos tempos apostólicos - testemunham que, nas reuniões litúrgicas dos primeiros cristãos, ressoava, em aramaico, o grito “Maranatha!”, que significa, precisamente, “Vem, Senhor!”. Uma oração a Cristo para que venha!
Naquela fase mais antiga, a invocação tinha um fundo que, hoje, diríamos escatológico. Com efeito, exprimia a ardente expectativa do regresso glorioso do Senhor. E este grito e a expectativa que ele manifesta nunca se apagaram na Igreja. Ainda hoje, na Missa, imediatamente após a consagração, ela proclama a morte e a ressurreição de Cristo, na expectativa da sua vinda: “Vinde, Senhor Jesus”. A Igreja está à espera da vinda do Senhor!
Mas esta expectativa da vinda última de Cristo não permaneceu a única. A ela uniu-se também a expectativa da sua vinda contínua na situação presente e peregrinante da Igreja. E é nesta vinda que a Igreja pensa, sobretudo, quando, animada pelo Espírito Santo, clama a Jesus: “Vem!”.
Houve uma mudança - melhor, uma evolução - cheia de significado, a propósito do clamor “Vem!”, “Vem, Senhor!”. Habitualmente, ele não se dirige apenas a Cristo, mas também ao próprio Espírito Santo! Quem clama é, agora, também, Aquele a quem se clama. “Vem!” é a invocação com que começam quase todos os hinos e orações da Igreja, dirigidos ao Espírito Santo: «Vem, Espírito criador!», dizemos no Veni Creator, e «Vem, Espírito Santo!», «Veni Sancte Spiritus!», na sequência do Pentecostes; e, assim, em muitas outras preces. É justo que seja assim porque, depois da Ressurreição, o Espírito Santo é o verdadeiro “alter ego” de Cristo: Aquele que O substitui; que O torna presente e activo na Igreja. É Ele que “anuncia as coisas futuras” (cf. Jo 16, 13) e que as faz desejar e esperar. Por isso, Cristo e o Espírito são inseparáveis, também na economia da salvação.
O Espírito Santo é a nascente, sempre jorrante, da esperança cristã. São Paulo deixou-nos estas palavras preciosas: «Que o Deus da esperança vos encha, na fé, de toda a alegria e paz, para que abundeis de esperança, em virtude do Espírito Santo» (Rom 15, 13). Se a Igreja é um barco, o Espírito Santo é a vela que a impele e a faz avançar no mar da história, tanto hoje como no passado!
Esperança não é uma palavra vazia, nem um nosso vago desejo de que as coisas corram bem: a esperança é uma certeza, porque se baseia na fidelidade de Deus às suas promessas. E, por isso, chama-se virtude teologal: pois é infundida por Deus e tem Deus como garante. Não é uma virtude passiva, que se limita a esperar que as coisas aconteçam. É uma virtude extremamente activa que ajuda a fazer com que elas ocorram. Alguém, que lutou pela libertação dos pobres, escreveu estas palavras: «O Espírito Santo está na origem do clamor dos pobres. Ele é a força dada a quantos não têm força. Ele trava a luta pela emancipação e pela plena realização do povo dos oprimidos» (J. COMBLIN, Spirito Santo e liberazione, Assis 1989, 236).
O cristão não pode contentar-se com ter esperança; deve, também, irradiar esperança; ser semeador de esperança. Este é o dom mais bonito que a Igreja pode oferecer a toda a humanidade, principalmente nos momentos em que tudo parece impelir a amainar as velas.
O apóstolo Pedro exortava os primeiros cristãos com as seguintes palavras: «Santificai o Senhor, Cristo, nos vossos corações, e estai sempre prontos a responder a todo aquele que vos perguntar a razão da vossa esperança». Contudo, acrescentava uma recomendação: «Mas fazei-o com mansidão e respeito» (1 Ped 3, 15-16). E isto porque não é tanto a força dos argumentos que convence as pessoas, mas o amor que soubermos pôr neles. Esta é a primeira e mais eficaz forma de evangelização. E está aberta a todos!
Estimados irmãos e irmãs, que o Espírito nos ajude sempre a “abundar na esperança, em virtude do Espírito Santo”! (cf. Santa Sé)