BEATO
VINCENÇ PRENNUSHI
Nicolau (Nikollë, em albanês) Prennushi nasceu em Scutari,( Shkodër, em albanês) na Albânia, no dia 4 de Setembro
de 1885. Aluno do Colégio Franciscano de Scutari, professou os votos religiosos,
na Ordem dos Frades Menores (Franciscanos) no dia 12 de Dezembro de 1904,
tomando o nome de Irmão Vincenç (em português, Vicente). Mais tarde, foi
enviado, pelos seus superiores, para Áustria, para frequentar o Curso
Teológico, no Tirol. Foi ordenado sacerdote, no dia 19 de Março de 1908, e
celebrou a sua primeira missa (a Missa Nova) uma semana depois, no dia 25 de
Março.
Depois da ordenação, o Padre Vicente retornou à
Albânia, onde, dois anos antes, a Província Franciscana da Santíssima
Anunciação tinha sido formada e colocada ao cuidado e orientação do croata
Padre Lovro Mihacevic.
O país encontrava-se, ainda, sob o domínio do Império
Otomano, mas começavam a mover-se várias realidades nacionais: por todo o lado,
surgiram círculos culturais albaneses e as pessoas começaram a pensar num tipo
de alfabeto latino, para transcrever a língua local.
A partir de 1909, esses movimentos culturais e
independentistas foram proibidos pelas autoridades da Turquia. Os chamados "Jovens
Turcos", movimento que tomou o poder em Istambul, proibiu a latinização do
alfabeto e organizou expedições militares nas montanhas albanesas. A sublevação
de Scurati e do Kosovo, em 1910, foi dominada, após uma resistência de três
meses.
O Padre Vicente tinha aderido inteiramente aos
movimentos patrióticos da Albânia mas, também, tinha intuído que os turcos
procurariam dividir os albaneses, associando-se e privilegiando os da religião
islâmica. Começou, então, a visitar quer os bairros muçulmanos, quer os bairros
católicos, apelando à reconciliação. Neste seu esforço e missão, ganhou o
apelido de "Anjo de Scutari".
Enquanto prosseguia com este seu apostolado, os otomanos pareciam aceitar a autonomia da Albânia: depois de uma nova revolta, em Julho de 1912, a Albânia pensou considerar-se livre, mas esta situação durou pouco tempo porque começou a ser disputada pela Grécia, pela Sérvia e pelo Montenegro. Este último sitiou Scutari e saqueou toda a região ao seu redor.
Enquanto prosseguia com este seu apostolado, os otomanos pareciam aceitar a autonomia da Albânia: depois de uma nova revolta, em Julho de 1912, a Albânia pensou considerar-se livre, mas esta situação durou pouco tempo porque começou a ser disputada pela Grécia, pela Sérvia e pelo Montenegro. Este último sitiou Scutari e saqueou toda a região ao seu redor.
Entretanto, o Padre Vicente continuava a pregar,
incansavelmente, apelando à concórdia e ajudando os mais pobres. Ao mesmo
tempo, assumiu cargos de responsabilidade dentro da sua Ordem: director da
tipografia franciscana de Scutari, reitor do colégio franciscano e guardião do
convento de Scutari. Foi, também, um apreciado pregador e conferencista de
renome. Muitas foram as suas obras literárias, desde as de natureza religiosa -
por exemplo, escreveu um livro sobre São Francisco e um sobre Santo António -
até às de natureza política, escrevendo um livro intitulado "No campo da
democracia real", publicado em 1922. Na sua produção literária tem lugar
importante a poesia, dedicada às tradições populares do seu país.
Em 1926, o Padre Vicente foi eleito Provincial dos
franciscanos, cargo que desempenhou por duas vezes. Foi, também, administrador
apostólico da Albânia Meridional. Em 1936, foi nomeado, pelo Papa Pio XII,
bispo de Sappa. Quatro anos mais tarde, em 26 de Junho de 1940, foi transferido
para a sede episcopal de Durazzo (em albanês, Durrës).
Todos os verões, monsenhor Prennushi costumava passar
férias em Delbinist, no Mar Adriático, na residência habitual dos bispos de
Durazzo. No entanto, a partir de 1945, as suas deixaram de ser simples férias:
os comunistas tinham começado a restringir a liberdade de todas as religiões.
Por isso, os campesinos reuniam-se à sua volta, em número cada vez mais crescente,
para escutar a sua palavra de conforto e de esperança.
Nos que respeita aos católicos, as perseguições foram,
primeiramente, contra os franciscanos e os jesuítas, por causa do seu trabalho
de consolidação da identidade nacional e da fé católica, especialmente entre as
pessoas dos campos e das classes dirigentes. Em 1945, o Núncio Apostólico na
Albânia, Dom Leone Giovanni Battista Nigris, levou esta questão ao Papa Pio
XII. Quando quis reentrar na Albânia, foi impedido pelo governo.
Com a morte do Arcebispo de Scutari, Dom Gaspër Thaçi,
em Maio de 1946, Monsenhor Prennushi tornou-se o Primaz da Igreja albanesa.
Nessa altura, começaram a chegar as notícias das primeiras prisões e
assassinatos de padres. No seu coração, cresceu a sua revolta e o seu pesar.
"É uma vergonha para aqueles que ainda estão fora das cadeias", confidenciou
ao seu sobrinho Mikel.
Bem depressa, chegou, também, a sua vez. Uma noite, em
Janeiro de 1947, quando se encontrava com o seu sobrinho na Casa Episcopal, foi
surpreendido pela presença de alguns emissários do governo: era intimado a ir a
Tirana, a capital. Partiu na manhã seguinte e, desde então, nem os seus amigos,
nem os seus parentes o viram mais. Pouco tempo depois de sair da residência
episcopal, os agentes da polícia secreta invadiram o seu gabinete de trabalho,
apoderaram-se dos seus arquivos e quebraram o seu crucifixo de madeira. Alguns
fragmentos do crucifixo, alguns livros e outros pequenos objectos foram
recolhidos e guardados pelo seu sobrinho.
Tendo chegado em Tirana, Dom Prennushi foi levado
directamente para o gabinete do Enver Hoxha. O chefe de Estado tinha-o
convocado, aparentemente, para o consultar sobre os problemas da Igreja
Católica, na Albânia. Mas, imediatamente, revelou as suas verdadeiras intenções:
queria pedir-lhe que assumisse a chefia de uma Igreja nacional, separada de
Roma, fazendo apelo para os seus ideais patrióticos.
Mas, a fidelidade ao Papa foi mais forte do que o seu
amor à pátria: o arcebispo recusou, categoricamente, todas as propostas. Nesse momento,
o ditador ordenou que fosse preso, imediatamente e, nos seus discursos,
sentia-se feliz por poder difamá-lo publicamente.
As acusações contra o Bispo foram as mesmas que usaram
contra todos os outros católicos que foram processados e condenados à morte,
durante o regime comunista: colaboracionismo com os fascistas, cumplicidade com
o Vaticano, maquinações contra o bem do povo.
Esta foi a sua única defesa: "Durante a minha
vida, nunca pensei ou agi mal em relação aos outros. Sempre procurei fazer bem
a todos, sem qualquer discriminação". Isso não chegou para evitar a sua
condenação: vinte anos de trabalho forçado.
Foi metido numa cela, de aproximadamente trinta por
cinquenta metros quadrados, juntamente com outros prisioneiros. Muitas vezes, quando
lhe pediam, ouvia as confidências dos companheiros de cela. Com um profundo
sentimento de fraternidade, por vezes, contava episódios da sua vida pessoal,
mas apenas com a preocupação de consolar a animar os outros. Volta e meia, uma
mulher piedosa levava-lhe um pouquinho mais de comida: prontamente, Dom Vicente
dividia-a por aqueles que o rodeavam.
A Arshi Pipa, escritor e ensaísta, preso com ele, contou
as torturas a que, frequentemente, era sujeito: agrediam-no com varas de madeira;
penduravam-no - de mãos e pés amarrados - num gancho, em frente da porta dos
sanitários dos oficiais da Sigurimi (a polícia albanesa sob o controlo do
Ministério do Interior); tiravam-no somente quando estava já desmaiado; "como
uma vaca no defumadouro”, para usar uma sua expressão sarcástica.
Numa outra ocasião, foi obrigado a levar pesados
troncos de madeira, subindo a colina que ficava ao lado da prisão Durazzo. Tinha
sessenta e cinco anos e, além disso, sofria de uma hérnia; no entanto, apresentou-se
para o trabalho a que eram sujeitos os outros prisioneiros. Eles, para o
ajudar, faziam questão de lhe deixar os troncos mais leves, mas, apesar disso
cansava-se muito: caia muitas vezes, ficava sem fôlego e os guardas troçavam
dele chamando-lhe "pastor", expressão usada como uma ofensa.
Em Novembro 1948, Monsenhor Prennushi sentiu-se muito
mal por causa de uma doença cardíaca grave: muito raramente saía da sua cela,
mesmo quando tinha permissão para sair até ao pátio. Então, foi enviado para o
hospital da prisão que não era outra coisa senão um pobre barracão, ao lado da
prisão central de Durazzo.
Além dos problemas cardíacos, os médicos verificaram
que tinha constantes crises de asma que o deixavam completamente exausto. Até
ao último momento, esperou ser libertado quando, após a ruptura da Albânia com o
regime da Jugoslávia, se espalharam boatos de que haveria uma amnistia.
Cada vez mais doente, uma noite, ouviram-no murmurar,
pesadamente: "Agora ... posso ... compreender ... o “Mehr Licht”... [Mais luz!] de Goethe ... Esta
luz que o poeta procurava … na hora … da sua morte ... não era, certamente, a
luz ... que nós vemos com os nossos
olhos de carne." Poucos dias depois, morreu: era o dia 19 de Março de
1949, aniversário da sua ordenação episcopal.
O seu corpo foi entregue à família: o seu irmão António,
ajudado por alguns amigos, fez um caixão, onde o depuseram. Depois,
enterraram-no, secretamente, na Catedral de Durazzo. No entanto, em 1967, a sua
sepultura foi profanada, antes de ser definitivamente fechada. Os ossos do
Arcebispo foram espalhados numa colina. Foi uma verdadeira "damnatio
memoriae" (condenação da memória), de quem nunca quis tornar-se um dos "homens
novos" louvados, queridos e promovidos pelo regime albanês.
Dom NikollëVincenç Prennushi foi beatificado, pelo
Papa Francisco, no 5 de Novembro de 2016, na Catedral de Santo Estêvão, em
Scutari., na Albânia. A celebração foi presidida pelo Prefeito da Congregação
para as Causas dos Santos, Cardeal Ângelo Amato, em nome do Papa.
A memória litúrgica do Beato Vicente Prennushi
celebra-se no dia 19 de Março.