BEATO JUSTO TAKAYAMA UKON
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O “SAMURAI DE CRISTO”
Takayama Ukon (de acordo com o uso japonês, o
sobrenome vai antes do nome), também conhecido como Hikogoro Shigetomo, nasceu
entre 1552 e 1553, no castelo de Takayama, perto de Nara. O seu pai, Takayama
Zusho (ou Takayama Tomoteru), pertenceu à nobreza militar que, na época, estava
frequentemente envolvida em várias guerras entre os diferentes senhores feudais:
de facto, a partir de 1538, Zusho Takayama serviu, como samurai, o nobre
Matsunaga Hisashide e tornou-se comandante do castelo de Sawa.
Naquele tempo, em 1563, Zusho também foi um dos juízes
encarregados de examinar o trabalho do jesuíta Padre Gaspar Vilela, que, quatro
anos antes, tinha fundado a primeira missão católica, em Kyoto, a sede do
Imperador. O padre Vilela respondeu com tanta firmeza às acusações que lhe
foram dirigidas que o samurai ficou convencido de que ele é que estava certo:
reconheceu a seriedade da doutrina cristã e converteu-se ao cristianismo. No
baptismo, recebeu o nome de Dario.
Quando voltou para o seu castelo de Sawa, convidou o
catequista Lorenzo, fiel companheiro do Padre Vilela, a explicar a sua fé à sua
família. Em 1563, muitos dos seus soldados, a sua esposa e os seus seis filhos
foram baptizados. Ukon, o filho mais velho, recebeu o nome cristão de Justo.
Por causa das contendas entre os vários chefes
militares, o clã Takayama sofreu um duro golpe: teve de abandonar o castelo de Sawa,
por causa dos inimigos do nobre que ele servia. Dario, então, juntou-se ao seu
amigo Wada Koremasa e ao seu exército. Ambos, começaram a mover influências para
que os missionários católicos pudessem instalar-se em Kyoto. O senhor do lugar,
Oda Nobunaga, consentiu na vinda dos missionários e, depois, protegeu a pequena
comunidade cristã ali fundada.
Nesta altura, Justo
estava na idade adequada para seguir a carreira militar. Em 1571, participou numa
batalha muito importante da qual saiu vitorioso. No entanto, com a morte de
Wada Koremasa, Justo desentendeu-se, radicalmente, com o filho de Wada,
Korenaga: os filhos dos dois amigos tiveram de lutar, um contra o outro, num
duelo. Justo venceu, matando o seu adversário, mas ficou
gravemente ferido. Permaneceu, muito tempo, entre a vida e a morte e, ao recuperar
a saúde, reconheceu que não se tinha conduzido de acordo com a fé que lhe fora
ensinada.
Dois anos depois, como recompensa pelos seus serviços,
Zusho Takayama recebeu o condado de Takatsuki. Justo Ukon assumiu o governo
deste condado, uma vez que o seu pai estava muito debilitado, por causa da sua
idade avançada.
Em 1574, Justo casou-se com uma cristã, de quem ele
teve três filhos e uma filha: dois dos filhos morreram pouco depois do
nascimento.
Sob sua liderança, Takatsuki tornou-se um importante
centro de actividades missionárias. Aqui, os que se preparavam para o baptismo
podiam reunir-se, em locais adequados, para receber, regularmente, a formação
doutrinal, ministrada por sacerdotes e religiosos. Justo aproveitou as
facilidades desta circunstância para aprofundar os conteúdos do Evangelho e, em
pouco tempo, foi considerado, pelos outros irmãos na fé, cristão exemplar.
No entanto, as questões da guerra ainda não tinham
sido concluídas. Em 1578, o daimyō Araki Murashige rebelou-se, abertamente,
contra Oda Nobunaga e aprisionou a irmã e filho de Justo Ukon. Este viu-se
frente a um dilema: sabia que o seu pai queria permanecer fiel ao compromisso com
o nobre mas, entretanto, o seu rival acampou frente ao castelo de Takatsuki,
exigindo a sua rendição e ameaçando perseguir os fiéis cristãos.
Justo rezou longamente e tomou uma decisão: devolveu
os direitos feudais ao seu pai e entregou-se pacificamente. Oda apreciou o seu
gesto e confirmou-o como senhor local, mas exilou Dario na província setentrional
de Echizen (hoje, província de Fukui). Dario aproveitou esta circunstância para
espalhar o cristianismo naquela região do Japão.
Entretanto, Justo fez uma carreira brilhante ao
serviço de Oda Nobunaga, tornando-se um dos seus primeiros generais. Continuou
a ajudar os cristãos: obteve licença para a construção da primeira igreja em Kyoto
(já não existente), de um outro edifício sagrado e de um seminário, em Azuchi,
no Lago Biwa. Em Takatsuki, o número de
crentes ia aumentando ano a ano.
Quando Oda Nobunaga foi assassinado por Akechi
Mitsuhide, os generais que lhe eram leais moveram guerra contra Mitsuhide e, depois,
colocaram-se ao serviço de Toyotomi Hideyoshi, o novo shogun. Justo ganhou,
rapidamente, a estima e a confiança do novo shogun. Assim, pôde continuar a
ajudar os cristãos, conseguindo muitas conversões, mesmo entre as personalidades
mais proeminentes. Em 1585, o shogun Toyotomi recompensou-o com um novo condado:
o de Akashi cuja população se converteu ao cristianismo.
No entanto, por várias razões, a partir de 1587,
Toyotomi Hideyoshi tornou-se hostil aos cristãos e ordenou a expulsão de todos
os missionários e dos estrangeiros em geral, e começou a pressionar os nobres
para que regressassem à religião dos seus antepassados.
Na noite de 24 de Julho, Justo Ukon foi convocado pelo
shogun, que lhe expressou o seu desagrado por ele ter levado à conversão ao
cristianismo muitos senhores feudais. Então, ordenou-lhe que abandonasse a sua
fé cristã, sob pena de o exilar e de expropriar as suas propriedades. O daimyo Justo
recusou-se firmemente a abandonar a sua fé, declarando que por nada deste mundo
rejeitaria o seu Deus, em quem os missionários o ensinaram a acreditar.
De imediato, foi condenado a perder as suas propriedades.
Justo implorou algum tempo para que pudesse, com a sua família, reorganizar a
sua vida. Passado este tempo de tolerância, Justo e a sua família refugiaram-se
na Ilha de Shodoshima, acolhidos na casa de um seu amigo, Konishi Yukinaga.
No entanto, o shogun Toyotomi Hideyoshio descobriu o
seu paradeiro e propôs a sua reintegração, concedendo-lhe a mesma posição
anterior, mas Justo rejeitou esta proposta. Então, foi feito prisioneiro e
levado para Kanazawa, onde sofreu grandes vexames e privações.
Algum tempo depois, talvez por se ter arrependido do
mal feito a um seu servo fiel, Toyotomi Hideyoshi mandou libertá-lo e
concedeu-lhe uma renda anual. Em 1592, o shogun reconciliou-se com Justo Ukon,
durante uma cerimónia solene, preparada para o efeito. Embora não tivesse sido seja
reintegrado como um daimyo, Justo podia mover-se livremente por todo o império
japonês. Justo aproveitou esta circunstância para desenvolver uma nova acção
missionária, colaborando nas actividades missionárias dos jesuítas que, um ano
antes da sua reconciliação com o shogun, tinham voltado às suas missões.
Em 1597, começaram novas perseguições contra os
cristãos: 26 católicos - estrangeiros e nativos - foram crucificados na colina
de Nagasaki, e um novo édito expulsou os cristãos do Japão. A morte súbita do
shogun parecia abrir uma certa esperança mas, Tokugawa Ieyasu, assumiu o
comando e, gradualmente, apoderou-se do trono, substituindo o herdeiro
legítimo.
Após uma fase inicial de apaziguamento para com a
religião cristã, o novo shogun, Tokugawa Ieyasu, começou a proibir vários
dignitários e nobres de receberem o baptismo. Finalmente, em 1614, emitiu uma
ordem de expulsão de todos os missionários. Os cristãos japoneses foram forçados
a retomar os costumes dos seus antepassados.
Com o reinício das perseguições, Justo Ukon foi
levado, sob prisão, para Kanazawa. Os seus amigos sugeriram-lhe que realizasse alguns
actos de abjuração formal da fé - como calcar imagens sagradas - mas Justo
recusou-se corajosamente. A quem lho sugeria, respondeu que estava ciente do
extraordinário tesouro que era a fé e a religião cristã. Por isso, não deveriam
fazer tal proposta, nem mesmo a brincar.
Juntamente com a sua família, Justo foi levado para Nagasaki.
Aqui, foi metido na prisão onde estavam reunidos os missionários e os cristãos
que não renegaram a sua fé. Passou sete meses à espera de morrer como mártir mas,
em 8 de Novembro de 1614, juntamente com um grupo de cerca de 300 cristãos, foi
metido, como se fosse lixo, num barco que rumou em direcção a Manila, nas
Filipinas. Durante o trajecto, Justo dedicou-se a consolar os outros, sobretudo
os doentes que, como ele, iam empilhados naquele pequeno barco. Quando
desembarcou, Justo teve uma recepção triunfal, como se tratasse de um
verdadeiro herói da fé.
Quarenta dias depois, Justo começou a ter febres muito
altas. Com a certeza estar no fim da sua vida, chamou o seu director
espiritual, o Padre Morejón, e recebeu os últimos sacramentos.
Apesar de gravemente doente, encorajava, os que o
rodeavam, a perseverar na fé e, constantemente, repetia o nome de Jesus. No dia
3 de Fevereiro de 1615, por volta da meia-noite, Justo depositou o seu espírito
nas mãos do Pai. Tinha 62 anos de idade.
Os espanhóis, que na época governavam as Filipinas e
tinham-lhe proposto ajudar a derrubar o shogun Tokugawa, deram-lhe um funeral
solene e com honras militares. Algum tempo depois, na Piazza Dilao, em Manila,
foi colocada uma estátua, em sua memória. Justo é apresentado vestido com a
roupa típica da sua posição, com a ‘katana, a tradicional espada japonesa, segurando,
nas mãos, a cruz de Cristo, que domina toda a estátua.
A Igreja Católica japonesa sempre viu em Justo um
testemunho genuíno da fé e, repetidamente, tentou iniciar o seu processo de beatificação.
A primeira tentativa, que remonta aos primeiros anos após a sua morte, foi
iniciativa dos sacerdotes de Manila. No entanto, a política isolacionista do
shogun Tokugawa impediu a recolha de provas documentais para este efeito.
A última e mais frutuosa intervenção, com o objectivo
da beatificação de Justo Ukon, começou em Outubro de 2012. Monsenhor Leone Jun
Ikenaga, arcebispo de Osaka e, na época, presidente da Conferência Episcopal
Japonesa, entregou uma carta ao Papa Bento XVI pedindo a análise do caso. Em Agosto
do ano seguinte, a Conferência Episcopal do Japão enviou os documentos do
processo à Congregação para as Causas dos Santos.
Em 2015, a "Positio" (documento da Santa Sé
que declara que alguém foi reconhecido como Venerável – primeiro passo para a
beatificação) foi transmitida à Igreja Japonesa. Nela, Justo Takayama é
apresentado como mártir: ficou reconhecido que a sua morte foi resultado das privações
e dos maus-tratos sofridos na prisão. Em 20 de Janeiro de 2016, o Papa Francisco
autorizou a promulgação do decreto pelo qual o seu martírio foi realmente
reconhecido.
No dia 7 de Fevereiro de 2017, Justo Ukon Takayama,
também chamado ‘Samurai de Cristo’, foi beatificado pelo Papa Francisco, no
Osaka-jō Hall, em Kyōbashi, perto de Osaka, em cerimónia presidida pelo Cardeal
Ângelo Amato, enviado do Santo Padre.
Foi a primeira vez que se fez uma celebração própria
para beatificar um único mártir, originário do Japão.